Dr. José Kormann (Histórias da História)
Historiador
Semelhança com Canudos
A revolta de Canudos foi na Bahia de 1896 a 1897. Há semelhanças entre os dois conflitos: grande população de marginalizados, fortíssimas lideranças messiânicas; grande envolvimento com o governo federal; decisiva atuação de tropas militares do exército nacional; tendências monarquistas restauradoras mais fortes na Bahia, mas também no Contestado; monge pregador na Bahia foi o popular Antônio Conselheiro e no Contestado foi o líder inicial José Maria e outros monges que o precederam; a tremenda crueldade repressora praticada pelas forças que combateram ambos os movimentos. Estas são algumas semelhanças mais evidentes nos dois movimentos.
Algumas diferenças entre as duas revoltas
Canudos causou grande temor à República proclamada em 1889 e ela ainda cambaleava sob o poder do primeiro presidente civil Prudente de Morais que, aliás, sofreu um atentado de morte. O Contestado também causou este temor, mas não tão grande assim uma vez que cronologicamente já era mais distante da Proclamação e assim encontrou uma República já bem mais consolidada. A disputa de terras entre Santa Catarina e o Paraná foi fator importante no Contestado e isso não houve em Canudos. O federalismo que afetou no Contestado não afetou Canudos. O Contestado não teve um Euclides da Cunha que historiou Canudos e assim ficou esquecido.
O Contestado e sua época
Socialmente o Contestado é muito semelhante aos outros conflitos do Império e da Primeira República. A população brasileira na época era pouco mais de 30 milhões de habitantes. Os estados do Paraná e de Santa Catarina tinham sua população em pouco mais de meio milhão cada um. A região do Contestado possuía, aproximadamente, 30.000 habitantes e 70% desse contingente atuava na informalidade: pequena criação de gado, caça, pesca, extração de erva mate etc. Havia, na região, grande concentração de propriedades e certo número de pequenas propriedades sob a influência política dos coronéis fazendários ou de outros setores.
O sistema eleitoral
Na época da Guerra do Contestado, 1912 a 1916, o sistema político que agia era o da Velha República, ou seja, a Política do Café com Leite, em que São Paulo, os barões do café, e Minas Gerais, os reis do gado leiteiro, colocavam os Presidentes da República. Eram os implantadores da República que mandavam e os demais estados vinham a reboque na política do coronelismo dos estados. Da população brasileira 80% eram analfabetos e assim proibidos de votar. Dos 20% alfabetizados só os homens votavam; mas realmente só os que tinham emprego formal, a grande minoria, é que não votava. Na região do Contestado havia, aproximadamente, 240 eleitores.
O Grupo Farquhar
Nesta região a situação humana era caótica, desigual e a violência imperava. Foi nesse contexto que o Grupo Farquhar de Percival Farquhar dos Estados Unidos, o dono do Brasil, como era chamado, ali se instalou com suas superpotentes empresas: Brasil Railway e a Southern Brazil Lumber and Colonization. A primeira desapropriava 30 km de terras ao longo da ferrovia que construía de norte a sul por Santa Catarina do Paraná ao Rio Grande do Sul. A Lumber conseguiu 180 mil hectares onde instalou suas ultramodernas serrarias. Para desapropriar as terras usava seu aparato militar particular que matava e expulsava dessas terras onde empregava pessoas de fora.
Sumário da Guerra
Área: centro norte catarinense, 40.000 Km²; exército: 7.000; caboclos mortos: 10.000; militares mortos: cerca de 500; população da área, um total de 30.000 habitantes.