Dr. José Kormann (A História da Câmara de São Bento do Sul)
Historiador
Capítulo – I
SÃO BENTO DO SUL – COLÔNIA AGRÍCOLA DE JOINVILLE
23/09/1873 a 30/01/1884
Para que fundar São Bento do Sul?
Foi com este intuito de ser colônia agrícola é que São Bento do Sul foi fundado no alto da serra para servir a Colônia Dona Francisca, atual Joinville, como fornecedor de produtos do planalto e ser consumidor de produtos da planície, além de servir de vilegiatura como tanto tempo o foi, ter interesses sanitários e até de segurança e refúgio em casos de guerra vinda do mar, a única guerra viável naqueles tempos para as regiões litorâneas.
Quase sempre na História do Brasil se procurava fazer com que a planície tivesse o seu planalto e cada planalto a sua planície. Assim foi com Santos e São Paulo, Rio de Janeiro e Petrópolis, Paranaguá e Curitiba, Joinville e São Bento do Sul, Lages e Laguna, etc. Onde isso não era possível como na grande Planície Amazônica, procurava-se então conectar o litoral com o vasto interior e essa hinterlândia com o seu litoral.
Talvez até Interesses em solidificar o trono imperial?
Após a guerra do Paraguai (1864-1870) houve realmente um interesse em criar por este imenso País uma espécie de nobreza com raízes locais que realmente formasse uma brasilidade para solidificar a situação vigente, assim:
Joinville era terra da Princesa Dona Francisca, filha de D. Pedro I e irmã de D. Pedro II e casada com o Príncipe de Joinville, filho do Rei Luís Felipe da França. São Bento do Sul e os atuais municípios de Campo Alegre e de Rio Negrinho eram propriedade da Princesa Isabel, filha de D. Pedro II e sobrinha da Princesa Dona Francisca. Era isto, sem dúvida, uma grande parentela de pessoas e de propriedades vizinhas. Resolveram uni-las pela segunda estrada carroçável do Brasil, a hoje Imperial Estrada Dona Francisca. Isso trouxe imigrantes e fez muito progresso inicial.
Quem eram esses imigrantes que povoaram São Bento do Sul?
Grande parte dos imigrantes de São Bento do Sul era bávara, ou seja, vieram da Baviera. Da divisa oeste da Baviera. Ficavam suas residências dos dois lados, leste e oeste, desta divisa ocupando grande parte da floresta da Boêmia, parte da atual República Tcheca. Eram descendentes dos povos francos e suevos e receberam o nome de bávaros pelo fato de se fixarem na Baviera. Este tradicional povo já havia sido elogiado pelo Imperador Carlos Magno (742 a 814) como sendo um dos melhores povos. Em seus documentos de emigração se dizia simplesmente que era bávaro e como tal, cidadão austríaco e não alemão como foram alcunhados pelo fato de embarcarem em Hamburgo na Alemanha, pelo menos em sua maioria eram cidadãos austríacos.
Por que emigraram?
A emigração ao Brasil teve, para os emigrantes, uma forte motivação social; pois, pobres habitantes destas regiões, não encontravam, em sua terra natal, esperança alguma de um dia serem proprietários. Lá, quem tinha terras, tinha; e quem não as possuísse, só lhe restava a condição irreversível de servo da gleba: trabalhar para um agricultor, recebendo um pobre pagamento anual ou trimestral, às vezes. Não havia alternativa. Eram realmente muito pobres. Geralmente dormiam na palha dos galpões do seu senhor, mas eram alegres, dispostos e facilmente davam abraços. Um canto popular regional dizia: “Die Leute von heute; sind lustig, sind froh; verkaufen das Betzeuch; und schlafen auf Stroh”. (O povo de hoje é alegre e feliz; vende sua roupa de cama e dorme na palha).
Por que o Brasil?
Mas no Brasil, ao contrário, poderiam ser donos de enormes nacos de terras. Até mesmo o fator herança, por muitos anos, não diminuiria as propriedades, visto que, além das áreas já colonizadas ou a serem colonizadas, sempre ainda haveria muitos terrenos para muitos herdeiros numa vasta hinterlândia a ser aproveitada.
Além disso, havia o caso de a Baviera e a Boêmia serem regiões de população católica e o Brasil um país onde essa religião era, então, constitucionalmente oficial. Mas havia um terceiro fator importante: a Baviera e a Boêmia eram reinos que integravam o Império Austro-Húngaro cuja família imperial era aparentada com a família imperial brasileira e assim os súditos de lá, facilmente sentir-se-iam súditos de cá.
Foi assim que a religião, a economia, as terras, o império de lá e de cá, o parentesco das famílias imperiais e a grande esperança de um mundo melhor, especialmente para seus filhos, que isso tudo se uniu para incentivar a procura de terras brasileiras.
Aqui lutaram e venceram
Foi assim que por esses bravos bávaros São Bento do Sul foi fundado a 23 de setembro de 1873. Alguns historiadores até consideraram essa empresa, a da fundação dessa maneira, uma loucura e grande imprudência colocar na mata bruta os imigrantes sem o devido apoio que deveriam ter. Apoio em todos os sentidos, mas lutaram e venceram mesmo que fosse apenas e verdadeiramente na terceira geração. É por isso que se dizia:
Aos primeiros, morte sem caixão;
Aos segundos a grande aflição;
Só aos terceiros o pão.
Se isso não pode ser entendido ao pé da letra, mostra, contudo, algo da realidade. Quantos morreram sem um mínimo de recursos, quantos carregados em maca por terríveis caminhos até Joinville, mas aos poucos as escolas foram surgindo no idioma polonês e alemão; a torre de uma tosca igreja, na verde floresta, já apontava as alturas do céu; sociedades foram fundadas; a produção aparecia e o comércio pela estrada carroçável Dona Francisca, inaugurada em 1877, desenvolveu o progresso pela grande circulação dos mais de mil carroceiros que por ela trafegavam levando e fazendo progresso.
Na primeira eleição, em Joinville, São Bento do Sul decidiu
Tanto São Bento do Sul cresceu e prosperou em todos os sentidos que já em 1884 pôde tornar-se independente de Joinville constituindo sua própria municipalidade. Não duraram onze anos essa dependência de Joinville e já nascia um novo ente municipal em Santa Catarina nos idos de 30 de janeiro de 1884. Mas antes disso, apenas três anos depois de sua imigração, já puderam participar das eleições municipais sem sair de sua localidade.
Durante estes, menos de onze anos, a Câmara de Joinville legislava para São Bento do Sul. No alto planalto ainda, para São Bento do Sul, não existia uma câmara que legislasse, pois São Bento do Sul ainda era, ou melhor, pertencia a Joinville e nem mesmo há notícias de que alguém de São Bento do Sul fosse candidato ou vereador para o poder legislativo em Joinville e isso mesmo seria quase impossível de vido a distância e os fatores condicionantes daquela época.
Mas do dia 07 ao dia 14 de outubro de 1876 eleitores de São Bento do Sul, 51 ao todo, votaram a primeira vez no Brasil. Foi em Joinville e decidiram esta eleição a favor do partido liberal e foi por isso que o partido conservador tentou anular os votos de São Bento do Sul, mas não o conseguiu e isso teria sido fácil, pois os votos de São Bento do Sul foram recolhidos em separado em sua própria localidade e assim se soube quais são. É que as eleições de então não eram secretas e assim se soube que todos os são-bentenses votaram, em unanimidade, dando a vitória ao partido liberal.
Leis de Joinville que atuaram sobre São Bento do Sul
Havia então algumas leis, para nós hoje um tanto curiosas, como sobre o peso máximo que as carroças podiam transportar, que a noite estas carroças deviam estar munidas de uma lanterna acesa e tantas outras mais, até mesmo quanto ao número de cavalos atrelados em vias públicas, dependendo das circunstâncias.
Os proprietários eram responsáveis pela manutenção das estradas em todo trajeto de sua propriedade, bem como fazer bem as roçadas anuais das testadas das mesmas.
Enfim, todas as leis que valiam para Joinville eram também válidas para São Bento do Sul já que constituíam uma só unidade municipal. Incluídos aí também todas as tachas, impostos, multas, etc. Que, sem dúvida, eram bem menos e menores do que em nosso tempo, embora a moeda em circulação também fosse bem menor e muito mais difícil de conseguir.