Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
Quando você mora em Brasília, as pessoas de fora costumam perguntar se você já encontrou alguma pessoa importante. Sim, eu já encontrei algumas delas. Ano passado, vi perfeitamente o Lula, com todos os seus nove dedos. Em outra oportunidade encontrei o Serra, que é ainda mais careca ao vivo. Também vi a Marina Silva no Senado, mas essa eu já havia encontrado em Curitiba. Foi também na capital paranaense que um dia fui agarrado pela Heloísa Helena, que me deu um beijo e fez carinho no meu cabelo.
De vez em quando eu também tenho a sorte de encontrar personalidades locais. Nesta segunda-feira, por exemplo, eu voltava para Brasília, depois de ter passado o feriadão em Curitiba, e encontrei no meu avião o deputado Silvio Dreveck.
Gostaria de poder dizer que ele me reconheceu, sentou ao meu lado, e conversamos animadamente sobre São Bento, inclusive trocando ideias sobre o desenvolvimento da cidade - tínhamos opiniões divergentes, mas nos tratamos com muita gentileza e respeito. Sim, seria muito interessante se tudo isso tivesse acontecido.
A verdade é que o deputado não me reconheceu - talvez por eu estar de óculos, ao contrário da foto desta coluna. Mas para mim era suficiente que ele estivesse lá. Ele é uma pessoa importante e eu pude me gabar por ter viajado no mesmo avião que ele - e, além de tudo, senti-me mais seguro, pois avião com político dificilmente cai.
Mas também existem algumas pessoas importantes fora da política. O Pelé, por exemplo. Eu nunca vi o Pelé, mas lembro que ele esteve em São Bento na abertura dos Jogos Abertos em 1996. Essas pessoas não costumam vir a São Bento, mas nem assim eu me animei a ir vê-lo. Não deixei, no entanto, de sentir um certo orgulho da minha cidade, que foi merecedora de receber tão ilustre visita. E acontecia o mesmo sempre que algum famoso dava as caras na região. Eram ocasiões especiais, e que nos deixavam meio bobos, desacostumados que estávamos com a presença de celebridades. Custamos a acreditar que pessoas tão incomuns estejam, por algum momento, fazendo parte da nossa vidinha.
Anônimos famosos
Há um jornalista americano muito macho chamado Gay Talese, que possui uma coletânea de reportagens chamada "Fama e Anonimato". Certa vez ele tentou fazer uma reportagem com o Frank Sinatra sem ouvi-lo: apenas observando os seus movimentos e conversando com as pessoas próximas. Pois, ainda assim, conseguiu traçar um belo perfil. Lembro que começava afirmando que Sinatra estava gripado.
Eu quis fazer o mesmo com o Dalton Trevisan - aquele escritor curitibano que sofre horrores por ser famoso. Ninguém consegue vê-lo ou fotografá-lo. Eu, como bom jornalista, iria fazer com que sofresse um pouco mais. Ficaria monitorando sua casa, ouviria o padeiro, os vizinhos, todo mundo. E publicaria um texto expondo o máximo que pudesse da sua vida anônima. Já tinha decidido até o começo da matéria: "Dalton Trevisan está gripado, e duvido que alguém consiga desmentir isso".
Acabei desistindo. Era trabalho para mais de uma pessoa - e, além do mais, ninguém pode provar sequer que ele esteja vivo. Talvez ele nem precisasse fazer tanto esforço - escritores, ainda que importantes, são anônimos por natureza.