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Henrique Fendrich

rikerichgmail.com

Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)

Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF


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No dia dos meus anos

Quarta, 22 de julho de 2015

 

No dia dos meus anos, eu achei que merecia jantar. Conhecia um restaurante barato e ia para lá sempre que sobrava algum dinheiro ou me sentisse especialmente feliz. Nessa época eu andava sempre sozinho e já havia me acostumado com a ideia de passar também o aniversário assim. Escurecia, e já não eram muitas as pessoas que eu encontrava na calçada. Mas um homem vinha na minha direção e me abordou. Pedia dinheiro. Menti que não tinha e, como para provar minhas palavras, bati com a mão no bolso. Minhas chaves estalaram e tive certeza que o homem achou que fossem moedas. Mostrei-me espantado com a descoberta de moedas no meu bolso e resolvi dar a ele algumas que realmente trazia comigo. Mas o homem achou pouco: não era suficiente para comprar o pacote de fraldas das suas crianças. E foi andando ao meu lado, tentando me convencer a dar pelo menos dez reais. Argumentou que preferia pedir a roubar e assegurou que Deus iria me abençoar. “Não tenho trocado”, menti.

Chegávamos a uma parte perigosa da cidade. Havia três ou quatro botecos ali perto com alguns tipos suspeitos à entrada. O homem sugeriu que fôssemos até um deles para trocar o meu dinheiro. Perguntei se não seria melhor procurar uma farmácia, onde eu mesmo poderia comprar o pacote de fraldas, mas ele fez de conta que não me ouviu. Insisti na pergunta e ele respondeu que não, que o melhor era dar o dinheiro, porque aí ele compraria as fraldas perto de sua casa, onde era mais barato. Não acreditei. Ele começou a falar nos filhos, gêmeos, enquanto caminhávamos até um dos botecos, em busca de um trocado que eu já tinha comigo.

Foi o próprio homem que tomou a iniciativa de perguntar ao atendente se ele trocava nota de 50. Mas não trocava, nem ele nem nenhum atendente dos outros botecos do lugar. Um dos tipos suspeitos se aproximou e ofereceu ajuda. Disse que sabia onde trocar. “Me dê a nota”, pediu. Eu dei, e vimos o homem ir perguntar no mesmo boteco em que já havíamos perguntado. Também ele, é claro, não teve sucesso. Foi quando eu e o homem das fraldas notamos que o sujeito começava a se afastar. Antes que ficássemos sem a nota, corremos atrás.

O sujeito se mostrou surpreso por pensarmos que tentaria fugir. “Eu sou bastante conhecido por aqui”, explicou. “Esse aqui eu conheço há muito tempo, não é não?”, disse ao segurança de um prédio por onde passávamos. O rapaz se atrapalhou e respondeu: “O senhor deve estar me confundindo...”. Eu já não tirava os olhos do sujeito quando ele se virou para mim e quis saber: “És brasileiro?”. Devo ter a ingenuidade de um turista. Respondi, seco: “Sim”. Ele se divertiu muito com a minha resposta e passou a me imitar: “Sim. Sim”.

Chegamos a mais um barzinho. Também ali não trocavam, mas o sujeito conseguiu a ajuda de um senhorzinho que bebia. Ele tirou um maço de notas do bolso e trocou a minha. O sujeito recebeu o dinheiro e o passou às minhas mãos. Para a minha surpresa, sem pedir comissão. O homem das fraldas é que me chamou de lado e pediu os seus dez reais. Paguei como se fosse uma dívida. Ele me aconselhou a sair dali o mais rápido possível, de preferência por outro caminho. Foi o que fiz. Eu ainda precisava jantar, aquele era o dia dos meus anos.



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