Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
As arquibancadas inferiores são muito próximas do gramado e eu escolho o meu lugar exatamente na metade do campo. Estou em um estádio da Copa do Mundo, prestes a ser entregue à FIFA. Venho assistir a uma partida muito mais modesta do que aquelas que se espera para o Mundial: Luziânia e Brasília, a final do Campeonato Brasiliense. E não teria vindo se não fosse atraído pelo anúncio de ingressos a um real. O estádio é enorme e eu demoro um bom tempo para contorná-lo em busca de um lugar à sombra. No caminho aproveito para ver como são esses banheiros padrão FIFA. Não são muito diferentes dos banheiros de shopping. Também vejo bebedouros, o que é muito útil para quem não quer pagar cinco reais na garrafinha.
Só depois de sentado é que descubro que estou no meio da torcida do Luziânia. Gente que viajou 60 quilômetros na esperança de ver, pela primeira vez, um time de Goiás ganhar o torneio do Distrito Federal. E são grandes as chances, podem perder por um gol. Não tenho time e penso em torcer por eles. Só que o sujeito atrás de mim começou a narrar a partida, lance a lance, como se estivesse na televisão, o que sem dúvida contribuiu para que eu torcesse pelo Brasília.
É aquela partida nervosa, um time fazendo cera e o outro mandando chuveirinho na área. De vez em quando eu preciso encolher as pernas para que um pipoqueiro passe por mim – nem o padrão FIFA resolve esse problema. O narradorzinho às vezes reclama que a torcida está muito calada. Primeiro tempo, segundo tempo, e a partida parece se encaminhar para aquele zero a zero modorrento. No finzinho sai um gol do Brasília, mas o título fica mesmo é com o Luziânia.
Conto 18 homens protegendo o trio de arbitragem. Nunca ninguém esteve tão seguro para errar. A saída do estádio é outra prova de fogo, mas consigo ir embora até com certa facilidade. Direi à FIFA que está tudo ok e que os jogos podem ser realizados normalmente. Mas recomendarei providências contra imitadores do Galvão Bueno.
Muita figurinha para trocar
Mal havia descido do ônibus, uma velhinha me alcançou e perguntou: “Você tem figurinha para trocar?”. E eu tinha, tinha muita figurinha para trocar. Era justamente para isso que eu havia saído de casa em plena manhã de sábado. Tirei o meu bolinho de figurinhas do bolso e começamos mais uma troca, enquanto caminhávamos ao ponto oficial.
O lugar, uma banca de jornal, estava mais cheio do que nunca. Muita gente, eu inclusive, prestes a completar o álbum. Em pouco tempo só me faltava uma figurinha, o escudo da Espanha. Não demorou até que eu topasse com um senhor que havia acabado de receber esse escudo, mas cedeu-o a mim quando soube que só me faltava essa para completar. Assim, consegui completar o álbum, o que me tira da brincadeira.
Ainda estava por lá distribuindo o resto das minhas repetidas quando ouvimos de um carro que passava pela banca de jornal o grito enfurecido de “Parem de financiar esta Copa!”. Olhei ao redor para ver se as pessoas haviam se ofendido, mas a maioria não conseguiu evitar o riso. E logo voltaram às suas trocas, todos bastante animados e concentrados nesta atividade hoje em dia tão reacionária que é a de colecionar figurinhas da Copa do Mundo.