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Henrique Fendrich

rikerichgmail.com

Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)

Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF


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História de um papagaio

Quarta, 26 de fevereiro de 2014

 

No princípio, era o Lôro e a Lôra. Vieram como presentes de dois amigos e durante mais de 30 anos dividiram a mesma gaiola num cantinho da cozinha. Todos os dias, às seis e meia da manhã, os papagaios eram levados para um poleiro no quintal. E lá recebiam água, frutas, sementes, pão dormido e – reza a lenda – até jiló, pois os bichos tinham um gosto meio duvidoso.  Ao fim do dia, os dois faziam um escândalo se não fossem levados de volta à sua gaiola. De vez em quando soltavam um grito estridente quando viam alguma coisa estranha. Essa rotina durou três décadas, até o dia em que a fêmea fugiu – isto é, aquela que todos acreditavam ser a fêmea, porque certeza mesmo ninguém tinha. Desde então (e lá se vão mais 12 anos) o Lôro passou a cultivar um ódio feroz contra o sexo feminino de maneira geral. Bastava uma mulher se aproximar que ele ameaçava atacar. Por duas ou três vezes mordeu feio a própria dona, uma velhinha que havia envelhecido junto com o papagaio e que o tinha como filho – ela até mesmo deixava de viajar se não tivesse com quem deixar o Lôro.

Esta manhã, como de costume, ela levou o papagaio para o quintal. Uma hora depois, o bicho deu um grito estranho, seguido de um suspiro. Em seguida, morreu. A velhinha, diante da perda repentina de um companheiro de 42 anos, até que foi forte: chorou apenas algumas lágrimas secas. Mas, sentada no sofá, ela relembrava com tristeza a história que teve com o papagaio. E estava tão abatida que um menininho da vizinhança viu e foi pedir ao avô um dinheirinho para que ela comprasse outro Lôro. Voltou com dez centavos e foi apenas nessa ocasião que a velhinha deu um sorriso.

Diz que da gaiola e do poleiro ela pretende se desfazer. Aos que perguntam se ela não quer mesmo um novo papagaio, ela responde que não, não quer sofrer de novo tudo isso que está sofrendo agora. Já o Lôro, esse não ataca mais ninguém: está enterrado nos fundos da casa, sob um pomar plantado pela própria velhinha.

 

A ditadura do riso

Quando me sinto entediado e coincide ser um dia de promoção, aproveito para ir ao cinema sozinho. Se não há um filme específico que me atraia, opto por aquele que mais se aproxime do drama e que menos promete tiros e explosões. Também não compro pipoca e muito menos açúcar gaseificado – sou um chato de galocha, logo se vê. Mas não deixo de pensar que ainda sou capaz de aproveitar o filme mais do que muita gente no cinema. Não estou, por exemplo, sob a ditadura do riso.

Afinal, por mais angustiante e dramática que seja a história na tela, há sempre aqueles com uma gargalhada engatilhada, pronta a ser disparada ao menor sinal de graça no filme. Não se admite a possibilidade de pagar para se divertir e não dar boas risadas. Até porque, também não se imagina que seja possível ter um prazer genuíno que dispense o riso. Então se aguarda ansiosamente o momento de rir, certos de que Hollywood pensa em tudo e preparou situações propícias para que ele aconteça – por mais angustiante e dramática que seja a história na tela. Outro dia fiquei sabendo que até durante uma ópera dramática no Teatro Municipal o que não faltou foi risada. Eu dei risada quando soube disso. 



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