Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
Ainda eram nove horas da manhã quando encontrei uma fila quilométrica do lado de fora do shopping center. A princípio pensei que houvesse algum tipo de liquidação. Depois me lembrei dessa história de rolezinho, que andou até fechando shopping por aqui, mas achei pouco provável que ele fosse praticado por pacatas senhoras de meia idade e suas respectivas crianças – pois eram estas as pessoas que compunham a fila. Notei ainda uma ambulância, o que de início me fez pensar em algum mutirão da saúde. Mas acabei indo para o trabalho sem descobrir qual era de fato a razão daquela fila.
Veio a hora do almoço e eu encontrei uma fila inacreditavelmente maior. Agora ela não apenas entrava no shopping como também subia pela escada até o segundo andar. Tive certeza de que algo extraordinário estava para acontecer. Enquanto buscava a origem daquilo, encontrei a livraria do shopping tão apinhada de gente que a fila do caixa quase saia pela porta. Na minha inocência, achei que eram pais desesperados para comprar material escolar para a volta às aulas. Continuei a seguir a fila principal até que finalmente encontrei uma porta fechada diante da qual todos esperavam. Com algum esforço para convencer os outros de que não estava roubando o lugar de ninguém, consegui me aproximar e ler um cartaz informando que naquela mesma tarde o Padre Marcelo Rossi estaria ali autografando o seu mais novo livro. Explicava-se, desse modo, não apenas a fila que se formava desde a manhãzinha como também a movimentação na livraria.
Olhei então a grande multidão e tive pena deles, porque eram como ovelhas que não têm pastor. O dia já estava adiantado, mas não havia quem lhes desse o que comer. Ali permaneceriam até anoitecer, em busca de uma assinatura e algumas palavras de conforto, palavras que não poderiam ser ministradas por um simples padre de paróquia. E tudo que conseguissem ali seria maior do que aquilo que conseguem sozinhos no quarto, com a porta fechada.
Sete copos d’água
Está certo que eu gosto de tomar água, ou se não gosto pelo menos tomo bastante, principalmente em oposição a refrigerantes, cervejas e alguns sucos. Mas mesmo eu achei um exagero ter que tomar sete copos d’água em sequência. Isso deve fazer até mal, de vez em quando sai notícia de alguém que morreu intoxicado de tanta água. Só que este era o único jeito de fazer o exame e, portanto, tive que concordar em encher absurdamente a minha bexiga. Os dois primeiros copos desceram tranquilamente. O terceiro e o quarto demoraram um pouco mais. Nos restantes eu tive a impressão de que iria vomitar água. Resisti, apesar de tudo.
Mas valeu a pena. Descobri muitas coisas com esse exame. Agora sei, por exemplo, que não apenas tenho um hepatocolédoco dentro de mim como ele inclusive mede 1 mm. Também soube que a minha vesícula, modéstia à parte, possui conteúdo anecóico. E que o meu rim esquerdo mede 111 mm, contra apenas 107 do meu rim direito, o que mostra bem as minhas tendências revolucionárias. Também estou devidamente informado de que o Ducto de Wirsung, provavelmente a parte europeia do meu pâncreas, apresenta calibre normal e linear.
Munido dessas informações, só me restou correr ao banheiro.