Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
Eu fico sem jeito quando preciso fotografar pessoas. Principalmente quando elas estão agindo naturalmente e, portanto, não esperam ser fotografadas. E mais ainda se uma dessas pessoas for um senhorzinho de cadeira de rodas às lágrimas. Ele vestia um daqueles roupões de hospital – pois estava em um hospital – e ouvia visivelmente emocionado as canções de Natal que uma mulher tocava ao violão para os doentes daquela ala. Ainda há pelo mundo uma ou outra pessoa que se preocupa com os Natais dos outros, que imagina não haver época mais triste do que essa para se estar internado em um hospital, e que por isso se dispõe a ir até lá para tentar tornar o deste ano um pouco mais suportável. A mulher oferecia a sua música, que era o que sabia fazer, e que foi suficiente para comover aquele senhorzinho.
E também ao fotógrafo, que ficou imaginando que tipo de dor ele sentia e quais recordações estavam sendo evocadas a partir daqueles acordes. Amparando o homem estava aquela que julguei ser a sua esposa. Ao contrário dele, estava serena, mas não era difícil adivinhar o sofrimento pelo qual a família vinha passando. Acabei tirando a foto.
No ambulatório de psiquiatria infantil a coisa foi ainda pior – para mim, claro. Por lá não teve música, mas Papai Noel. Pessoalmente, não gosto do bom velhinho. Mas era coisa de se ver o furor que causava em meio às crianças – e crianças, por que, meu Deus, com problemas psiquiátricos. Comoveu-me especialmente uma menina, que devia ter os seus sete, oito anos. Toda retraída, não conseguia se aproximar do Papai Noel. A mãe incentivava, mas ela hesitava. Vestia uma blusa rosa com a estampa de um sorridente Garfield, e até isso me tocou, porque vi toda a dedicação da mãe. Uma amiguinha mais desinibida a acompanhou e ela, toda sem jeito, enfim cumprimentou aquele sujeito esquisito. Não sorria nunca, apenas olhava com curiosidade. E tudo isso me deixou abatido, pelo Natal que temos e a vida que levamos. Mas tirei a foto.
Um cartão
Recebi da minha dentista um cartão de Natal, bem simplesinho, como devem ser os cartões daqueles que têm muitos a enviar. O texto limita-se ao básico, desejando-me um feliz Natal e um próspero Ano Novo. Nenhuma referência carinhosa ao meu tratamento, nenhum elogio à dedicação com que tenho colocado elásticos boca adentro. Quem me mandou aquele cartão não foi exatamente a dentista, mas o seu consultório.
Recebê-lo me fez pensar se as pessoas ainda mandam cartões umas às outras. Não acompanhado de presentes, mas só o cartão mesmo. Desses que precisam ser colocados em um envelope e levados ao correio. E resolvi dar uma passada em uma papelaria para ver alguns deles. Há alguns muito bonitos, embora seja difícil coincidir a mensagem com a pessoa a quem se pretende enviá-lo. Vários se esforçam para dizer as mesmas coisas de um jeito diferente. Existem cartões cuja única mensagem é Feliz Natal em português, inglês, alemão, russo, finlandês. Boa parte não deixa muito espaço para você escrever a caneta a sua própria mensagem.
Mesmo assim, decido comprar alguns. É a minha concessão a essa história de que é preciso presentear no Natal. Mandarei a algumas pessoas – não ao consultório.