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Henrique Fendrich

rikerichgmail.com

Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)

Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF


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Ninguém volta atrás

Segunda, 25 de março de 2013


Não sei se já perceberam. Hoje em dia ninguém mais volta atrás. O sujeito nega a própria lei da gravidade mas não volta atrás. Observem uma discussão qualquer. Sempre há um sujeito que está majestosamente certo e outro que está miseravelmente enganado. Em tudo. Não há uma mísera e escassa concessão ao rival. Se parece exagero, acompanhem a progressão dos argumentos nessas discussões. E tentem se lembrar de um único caso recente em que alguém foi convencido de que estava errado e voltou atrás.

O cronista Artur da Távola dizia que a “opinião” é uma das primeiras reações que temos diante das coisas. Expressa um sentimento e um julgamento inicial, a primeira coisa que passa pela nossa cabeça. Por isso, ela não explica toda uma realidade. Nela não há espaço para as contradições. Isso não deveria ser um problema, desde que encarássemos a opinião como parte do processo para chegar até a verdade, e não a verdade em si. Para Artur da Távola, opinar é apenas manifestar uma impressão, supor uma realidade, discuti-la e, se for o caso, retificá-la. É tudo muito bonito, mas o que nós fazemos é nos agarrar à nossa própria opinião.

E, por isso, ninguém volta atrás, e pior: ninguém chega à conclusão nenhuma. Digamos alguém tem uma opinião e que é totalmente oposta ao de outro. São duas manifestações superficiais - perfeitamente válidas, mas ainda superficiais. Por ser uma opinião, significa que ainda há contradições não resolvidas. Os dois sabem perfeitamente disso, mas então acontece essa coisa admirável: só reconhecem as contradições do outro. Fazem questão de apontá-las. E se livram daquelas apontadas para si como se fossem uma barata seca. Já que nenhum deles vai conseguir convencer o outro, em determinado momento um deles se cansa e desiste de chegar à verdade, alegando coisas como “Cada um tem a sua opinião, eu tenho a minha”.

A opinião compromete ao infinito, dizia Nelson, o Rodrigues. E somos realmente escravos das nossas opiniões. Talvez tenhamos medo de que voltar atrás abale o nosso prestígio E tem ainda a questão da coerência. É um equívoco achar que a coerência consiste em ser fiel à mesma opinião durante toda uma vida - ela parece ser resultado de como reagimos diante das novas informações que recebemos e das experiências pelas quais passamos. Transformando as discussões em mero confronto de opiniões, impedimos o nosso próprio conhecimento e fazemos com que todos os discursos se tornem válidos, bastando a cada um apenas escolher aquele em que mais acredita - embora teimemos em achar que estamos sendo racionais.

Tivemos aí o caso de um Papa que renunciou. Pode-se dizer que, diante de circunstâncias que lhe afetaram, ele decidiu voltar atrás. Há muita gente que só acredita em um Papa que continue a ser Papa ainda que cravado de balas. Exige-se o martírio alheio - um sinal de coerência. Não perdoamos quem não cumpre a sua missão até o fim porque nos parece covardia. Que vá adiante, não retroceda jamais. Pois eu deixo aqui a minha simpatia ao antigo Papa. Acho que não há mais muita gente disposta a renunciar ao que quer que seja. Eu e ele não temos mais a mesma religião - eu voltei atrás - mas deixo aqui os meus cumprimentos.



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