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Michell Foitte

michell_foittehotmail.com

Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta

CRP 12/07911


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O Psicólogo

Quarta, 26 de agosto de 2015

 

– Marido... Precisamos conversar.

Ptolomeu olhava a esposa enquanto fatiava o rosbife. Algumas ervilhas escaparam pela tangente quando a carne deslizou do prato banhada no próprio sangue.

– O que é agora Maria?

Maria sentiu-se culpada pelas ervilhas rolantes.

– É o Luizinho! – falou Maria com a voz trêmula.

– O que é que tem nosso filho?

– Ele não quer mais ser médico.

A faca atravessou a carne e alcançou o prato que fez um ruído parecido com giz branco riscando o quadro-negro. Ptolomeu é do tempo em que as matérias em sala de aula eram passadas nessa lousa escura.

– Como assim Maria?

Essa notícia fez sumir o apetite de Ptolomeu.

– Não sei, ele acordou dizendo isso...

– Tudo bem o Luizinho ter abandonado a ideia de ingressar na carreira política, mas deixar de ser um médico de família aí já é demais. Onde o Luiz está?

– Estudando.

– O que ele está estudando?

– Ai Ptolomeu, acho que é o tal de Fred...

– O amigo do Barney?

– Não!

– O do filme de terror?

– Não, não!

Maria começava a fazer mímica.

– Ah já sei, o do Fluminense?

– Não Ptolomeu. É aquele do divã!

Ptolomeu entendeu quem era. Não apenas o apetite do pai foi tirado pela decisão do filho, como o sono também. Luiz simplesmente acordou como uma flor que desabrocha seu botão pela manhã para ter do sol a vitalidade para o seu dia. E naquele dia amanheceu vistosa.

Luiz entregou-se com perseverança aos estudos da mente humana. Pearls, Granzotto, Freud, Moreno, Bock, Müller. Luiz lia com afinco autores da psicologia. Em uma semana tinha escrito um artigo para enviar para a revista científica Psyco, intitulado: Processos de saúde e doença e estranhezas da psicologia.

Nada poderia dar mais desgosto a Ptolomeu do que um filho psicólogo. Mesmo quando Luizinho entregou o seu artigo publicado na Psyco com críticas de elogios ao jovem pensador.

Ptolomeu sempre imaginou chegar ao quarto do filho e quando a conversa ficasse séria fecharia a porta para dizer coisas belíssimas ao primogênito, do tipo:  “Meu filho, vou dizer-te coisas não de pai para filho, mas, de amigo para amigo. Um diploma de médico poderá abrir portas para você que para muitos é intransponível. Será conhecido como “Doutor” e isso significa levantar-se da obscuridade da vida comum dos reles mortais. Ser médico é como ganhar na mega-sena , um fenômeno. Ser médico é fazer igual Jesus quando curou a cegueira e fez pessoas andarem novamente, sem contar nas multiplicações das notas de Reais que entrarão em sua carteira. Poderás atender pessoas a cada dez minutos no máximo e dizer sem se preocupar que é tudo virose, e tudo isso é suficiente para uma platéia afoita que só precisa ser ouvida de sua aflição. Quem sabe médico de posto de saúde pela manhã para não cansar muito e consultório particular a tarde, só para pegar mais leve? Meu filho, outras coisas, estudos, profissões são estudos e profissões inúteis, pense nisso meu querido filho, futuro médico Doutor.”

– Ptolomeu... Ptolomeu... Está tudo bem?

Ptolomeu estava semanas naquela inércia, divagando coisas sobre o futuro do Luizinho. Nem ervilhas Ptolomeu ingeria mais.

– Está tudo bem Maria. Estava pensando em nosso filho.

– Você precisa entender marido que não da para ficar assim, nessa... nessa... Como é mesmo o nome... Luizinho se estivesse aqui saberia dizer....

– Maria, deixe-me te perguntar. O Luiz está irredutível com a decisão da profissão?

A esposa apenas bateu com a cabeça em afirmativo.

– Não há nada que podemos fazer? Não há remédios para isso?

Maria afirmou. Não teria o que ser feito.

– Talvez uma última tentativa?

– E qual seria marido?

– Quem sabe levar o Luizinho a um psicólogo e sei lá, quem sabe, ele ajude-o a mudar de ideia?

 

Michell Foitte está de férias e retorna na segunda semana de Setembro.

Texto publicado no JE em Junho de 2014

* Dia 27 de Agosto é o dia do Psicólogo.

 



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