Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta
CRP 12/07911
Claudio Alberto, pai de Ana Carolina, pescador com mais de cinquenta anos de mar, o “velho lobo cinzento do mar”, como era chamado por seus amigos, acostumado com o oceano bravio e a não enjoar em dias de ressaca com ressaca, deixou a pedido da filha que o futuro genro fizesse o almoço de domingo em sua casa.
Natan chegou à casa do “velho lobo cinzento” com uma parafernália de panelas e facas e ainda uma dúzia de condimentos diversos.
Dona Lurdes, mãe de Ana, olhou de soslaio para todos aqueles tubinhos de ensaio cheios de ervas multicoloridas que Natan havia trazido, e como era uma mulher nativa e adepta aos costumes bruxólicos, tratou logo de fazer uma reza.
Ana educadamente apresentou Natan aos pais. O jovem com a franja do cabelo cuidadosamente feita na chapinha. Os pelos do braço e do peito extraídos com cera de abelha africana. As sobrancelhas delineadas delicadamente com a técnica de fio oriental.
As únicas linhas que Claudio Alberto se deixava encostar no corpo eram as de pesca por profissão, e as de cerol nos fios das pipas por diversão.
Mas eram outros tempos. Lurdes e Claudio relevaram.
Natan pegou as cocorocas e as tainhas, cortando a cabeça e o rabo dos peixes com uma faca elétrica. Cortar o rabo e a cabeça de um peixe para um pescador era como cortar o macarrão ao meio no prato de um italiano – uma tragédia. E Natan ainda continuou, introduziu uma meia dúzia de temperos e meia linguiça calabresa nas barrigueiras.
Ana preparava o arroz à grega para impressionar o namorado. Nessa hora a água do feijão já havia secado e começa a queimar o teflon da novíssima panela.
Na primeira virada da grelha, Natan viu a linguiça escapar para dentro do carvão que ainda não estava em brasas.
Quinze minutos depois, o almoço estava servido. Uma hora depois Natan havia ido embora com as panelas e as facas, porém, dos condimentos, alguns deles dona Lurdes fez questão de ficar para as suas poções de curandeira. Trinta segundos depois Ana questionava os pais os porquês de ambos não aceitarem o seu namoro.
Então, o “velho lobo cinzento do mar” se pronunciou:
― Minha filha, não foi por causa de que o seu namorado é meio, como vou dizer... Assim... Meio fresco! Não foi por causa disso. Também não foi pelo fato de o arroz ter empapado ou pelo feijão ter queimado, nem pelo motivo dos peixes terem sido tostados pelo lado de fora e estarem crus por dentro, nem pelo quite James Bond que seu ex-namorado trouxe...
―Não foi por causa de que os peixes estavam sem rabo e sem cabeça... ― completou Dona Lurdes, em meio a sua reza bruxólica.
― Minha filha, faltou o simples! ― disse Claudio Alberto.
―O que papai?
― Pirão d’água! ― Falou o “velho lobo cinzento”.
― Pirão d’água! ― concordou dona Lurdes.