Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta
CRP 12/07911
A Boneca e o Gnomo Viajantes
Há tempos quis ler “Kafka e a Boneca Viajante”, mas estava sempre adquirindo algum outro livro, ou estava com acúmulos de afazeres, o que, por fim, protelava o feito.
Contudo, nessa semana o fiz. Algumas horas à noite e mais uns minutos na manha seguinte e chegava ao término daquela história que traz como significado maior a sensibilidade de ver no invisível, mundos que nos saltam aos olhos.
No livro, Kafka, comovido com as lágrimas da pequena Elsi, que se encontrava chorando no parque Steglitz, por ter perdido sua boneca, constrói um mundo próprio quando dá vida à imaginação da garotinha. Dá vida a uma boneca perdida, que reaparece dando notícias através de cartas ― escritas e imaginadas pelo próprio Kafka, que se denomina “o carteiro de bonecas”. Este sendo o portador das cartas de todas as bonecas viajantes às suas respectivas donas.
A boneca, por sua vez, escreve de vários continentes, dos mais incríveis lugares e narra as suas aventuras, suas experiências, seus amores... Sua gratidão por ter sido tão bem cuidada pela pequena Elsi.
Outra transmutação do invisível ao visível é o gnomo viajante no filme “O fabuloso destino de Amélie Poulain”, do diretor Jean-Pierre Jeunet.
O gnomo que aparentemente cria vida, e por não querer se submeter a permanecer estático sobre o termo de um pequeno jazigo incrustado no pomar onde seria destinado a apodrecer e fenecer encoberto por limo no tempo e pelo tempo, some - e reaparece enviando cartões postais de diversas regiões pelo mundo onde se exibe junto às fotografias. Com isso, a sua mensagem é mais ou menos a de que enquanto houver possibilidades de mudar a vida, mude, mesmo que seja um Anão de jardim.
Tanto o livro quanto o filme trouxeram-me a relembrar uma frase do documentário “Visão Além do Alcance”, que são histórias/relatos de pessoas com deficiências visuais, em que uma das personagens diz que ao ficar cego, os seus familiares começaram a ficar invisíveis frente a ele, não pelo fato dele ter perdido a visão, mas pelo motivo de ter deixado de vê-los dentro de si.
Se uma boneca e um gnomo são capazes de viajar, mesmo que seja na imaginação de seus criadores, o que dizer de nós que somos criadores de nossas próprias vidas?
Uma boa viagem!