Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta
CRP 12/07911
Rudolf e Roy
Chamada ao colégio, a mãe de Roni ouviu a seguinte frase da diretora:
― Esse menino deve ter dupla personalidade... ora é um menino zeloso que cuida da organização das tarefas em sala de aula, é o mais interessado em ajudar os outros que estão com dificuldades em alguma matéria; ora é o menino que coloca fogo nas cortinas, que esfrega meleca no cabelo das meninas, que abaixa as calças e brinca de bilaucóptero.
― Bilaucóptero? ― pergunta a mãe à diretora.
― Coisa de menino! ― diz a diretora ruborizada.
***
Em casa Roni prepara na sanduicheira seu lanche da tarde. Enquanto o cheirinho de sanduíche ia se alojando pelos cantos da casa, Snow, o gato persa, se esfregou pelas pernas de Roni, que, de súbito, pega o felino em seus braços. O que se ouviu depois foi uma mistura de ronronar gritante com um tom de lamúria. Roni prensou o rabo do gato na chapa quente. Precisou mais de um mês para os pelos do bicho voltarem a crescer.
Em outro momento Roni plantava margaridas no quintal de casa, e ajudava os vizinhos a vender as rifas para ampliar a construção do salão paroquial da igreja matriz, tudo para que a melhor idade pudesse aproveitar momentos de alegria, de pressão alta e vertigem, esses dois últimos devido às várias músicas que as mulheres dançavam e rodopiavam agarradinhas. Não era de se espantar que os homens evitassem tais encontros, pois eram raros os pares masculinos que sobreviviam sem sequelas ao final do terceiro xote.
Ao mesmo tempo, Roni preparava o bolo para o Fristick das senhoras do salão paroquial, e junto ao quintal das margaridas pegava minhocas e uma porção de formigas, e estava preparado o bolo formigueiro. Uma beata deu o primeiro pedaço do bolo “batizado” ao padre, que precisou tomar cinco taças de vinho para fazê-lo descer.
***
― É, o seu filho tem pelo CID um F44.8...
Roni se assustou, pensou que tinha o Cid Moreira pilotando um avião de caça dentro de seu corpo.
―... que é um transtorno de múltiplas personalidades. ― Falou o psiquiatra ― E por isso ele demonstra características de mais de uma identidade distinta.
***
― Vai meu, acorda esse preguiçoso!
― Ele não é preguiçoso, só está cansado!
― Acorda ele que quero aprontar alguma coisa.
― Você só pensa em bobagens...
― Mas que m... é essa. Quem são vocês que tanto falam aí na minha cabeça? ― Disse Roni ao acordar.
― Esse aqui é o Roy.
― Esse outro mala casto é o R-u-d-o-l-f... igual a rena baitola do papai Noel. (Risos)
Rudolf era o lado puro de Roni, o romântico, o que bebia leite morno antes de dormir, o organizado, o lado medroso que dormia de luz acesa e gostava de ler poesia e gibis. Roy era a mancha preta da ovelha negra, o louco alucinado que gostava de passar a mão na bunda das coleguinhas e tomava cola cascorez como se fosse água benta, era o lado perverso, sádico. Rudolf, o bom, o meigo, o bom filho, o masoquista.
― Vocês estão me causando problemas! ― Disse Roni a Rudolf e Roy.
― Quem nos causa problemas é o Rudolf! ― Afirmou Roy.
― Eu? Você é um demente mesmo! ― Retrucou Rudolf.
― Calma aí vocês dois. Vamos organizar as coisas. Doze horas para cada um está bom? ― Roni.
― Acho assim melhor... ― dizia Rudolf. ... ― Não, esse negócio de organização e hora marcada não é comigo, eu gosto é do risco, do improviso, da espontaneidade... ― disse Roy.
― Parem com isso, amanha conversaremos melhor, agora vamos voltar a dormir. ― Falou Roni.
― Acho bom descansarmos. Amanhã é outro dia. ― Falou Rudolf.
― Seus maricas, vamos aproveitar a noite, contar umas piadas, ver quem solta o maior número de puns, vamos lá, a vida é uma só... ― dizia Roy.
(continua na próxima)