Premissa
Na história da existência, constantemente somos desafiados pela vida a darmos uma resposta ativa, consciente e madura ante os apelos e desafios que a nossa própria existência nos interpela. A todo instante somos colocados em uma posição de escolha, entre aquilo que se quer, e aquilo que não se quer; entre o possuir e o nada ter; entre o ser e o não ser.
Sim e não
O sim e o não fazem parte do nosso cotidiano, sem eles dificilmente poderíamos ser propriamente humanos. Eis o que diz o Senhor: hoje estou colocando diante de ti a vida e a felicidade, a morte e a infelicidade (Dt 30,15). Neste contexto de escolha propriamente humana, se encontra a Virgem Mãe de Nazaré.
Eis a serva do Senhor
Maria, na plenitude de sua liberdade, escuta, mais do que a saudação de um anjo, a voz de Deus, a voz de sua própria consciência a te indagar: “Não temas, Maria! Encontraste graça junto de Deus. Eis que conceberás no teu seio e darás à luz um filho, e tu o chamarás com o nome de Jesus” (Lc 1,30). Diante da proposta, Maria dá sua resposta: “Eis aqui a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua Palavra”. Foi por causa dessa resposta que o Eterno entrou no tempo; que o Todo assume em si o fragmento, Deus assume a forma humana para nos salvar.
O sim de uma mulher
A Solenidade da Anunciação do Senhor que encontra o seu fundamento bíblico situado na narrativa evangélica do evangelista Lucas, no capítulo 1, 26-38. É a solenidade que exalta na sua estrutura interna o sim de uma Mulher ao projeto salvífico de Deus, mas que, de modo mais singular, quer manifestar a grandiosidade do sim definitivo de Deus para com a humanidade. A anunciação do Senhor é a solenidade que por excelência expressa a vontade divina de querer dar-se ao conhecer ao homem e o salvá-lo, e ao mesmo tempo a disponibilidade do ser humano em acolher essa auto revelação divina.
Encarnação do Verbo
O episódio narrado no Evangelho de Lucas, mostra a origem histórica do problema enfrentado pelas primeiras comunidades cristã acerca da encarnação total do Verbo eterno de Deus no seio virginal de Maria. A narrativa explicita o diálogo realizado entre Divino e o humano, entre Maria, e o anjo, o mensageiro de Deus. Maria na narrativa é interpelada pelo anjo acerca da vontade divina que encontrou nela, a simples jovem de Nazaré, graça diante de Deus. Neste episódio evangélico, contemplamos que a liberdade humana, que é fruto do amor de Deus aos homens, nunca foi violado pelo Criador, ao contrário, Ele propõe a Maria uma missão, e Maria na sua total liberdade se dispõe a realiza-la, mesmo não sabendo como tudo se daria.
Essa bela narrativa, a pouco comentada, muito fora debatida pelos Padres da Igreja, na reta intenção de defender não somente a Virgindade e Maternidade de Maria, mas, sobretudo, a real Encarnação e Divindade de Jesus, seu filho. Em meados dos anos 325 d.C., com o Concílio de Nicéia e de Constantinopla (381), foram estabelecidos no símbolo da fé, o Credo Nicenoconstantinopolitano, a sentença dogmática de que, verdadeiramente o Verbo eterno de Deus encarnada no seio da humanidade por meio da concepção virginal de Maria, era realmente o Filho de Deus. Em Jesus, a natureza humana e divina coabitavam mutualmente, sem confusão, mas em plena união hipostática de naturezas. O pequeno e humilde carpinteiro de Nazaré, era na verdade, o verdadeiro Filho de Deus emanada na história humana pela ação do Espírito Santo.
Theotokos
Contudo, foi somente em 431 d.C., no Concílio de Éfeso, que a Igreja proclama solenemente Maria como Mãe de Deus (Theotokos), defendendo desta maneira, a real Encarnação do Filho de Deus no seio da humanidade por meio do sim de Maria. Tal decreto, resultou posteriormente a instituição da festa litúrgica da Anunciação do Senhor. Todavia, a Igreja, por volta do século Vi, sob o comando do pontífice Sérgio I, introduziu definitivamente no calendário litúrgico da Igreja romana a solenidade da Anunciação do Senhor, que é celebrada todos os anos no dia 25 de março, a exatos nove meses do Natal do Senhor.
De fato, no sim de Maria, o sim de Deus em favor da humanidade é plenamente realizado. Em Maria, Deus realiza o seu projeto salvífico no tempo e na história humana. Se por Eva nos veio a desgraça, por Maria, nos foi novamente aberta as portas da Graça.
Sentido da Solenidade
Celebrar a solenidade da Anunciação do Senhor, é dar graças a Deus por todos os benefícios que pelo sim de Maria o Senhor nos dispensou. Celebrar a festa solene da Anunciação do Senhor, é contemplar a salvação de Deus realizada no sim de uma Mulher. É contemplar o sim de Deus por meio de uma Mulher. O sim de Maria foi um sim que mudou o curso da história. O sim de Maria, nos possibilitou conhecermos o Pai, revelado pelo Filho no poder e na ação do Espírito Santo. Também nós, somos convidados a mudar o curso da história em razão do nosso sim à Deus, ao projeto de Deus.
Deus em meio a nós
Deus quer habitar no mundo, na realidade do mundo, na nossa família, na nossa sociedade, no nosso país. Mas, para que isso posso se realizar, é preciso que também nós, sejamos, assim como a pequena jovem de Nazaré, abertos e generosos a acolher a vontade de Deus em nossa vida, para que, o verdadeiro valor de um sim possa transformar o curso da história.