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Qual a responsabilidade penal dos índios?

Quarta, 19 de abril de 2017

Dia 19 de Abril é o dia dos Índios. Pensando sobre o tema, trazemos um debate muito pouco visto: a questão da responsabilidade penal indígena.

Por responsabilidade penal estamos a falar sobre o dever jurídico de responder pela ação delituosa que recai sobre o agente imputável.

Este nosso texto, por considerar este assunto de suma relevância, quer apresentar pontos críticos para refletirmos sobre o que é a responsabilidade penal; também analisarmos o Estatuto do Índio com a sua lógica integracionista e o alcance e aplicação do Direito Penal diante desta população diferente da nossa.

 
 

Responsabilidade Penal

Como se sabe, alguém só será responsabilizado por crime se tiver dado causa a ele, por dolo ou culpa. Pra isto, para saber se alguém cometeu um crime, é imperioso fazer três perguntas:

  1. O sujeito praticou o delito?

  2. O sujeito, à época, tinha entendimento do caráter criminoso da ação?

  3. O sujeito podia escolher entre praticar e não praticar a ação?

Em caso de respostas negativas não há como imputar um crime, pois falta aquilo que chamamos de conduta punível - presente, pois, a ausência de ação ou omissão que deu causa ao crime. É por esta razão que Cezar Bittencourt diz

A conduta (ação ou omissão) é pedra angular da Teoria do Crime. E a capacidade de ação, de culpabilidade, exige a vontade - que é entendida como faculdade psíquica da pessoa individual.

No entanto, em se tratando de indígenas, é preciso ir um pouco mais além do acima exposto.

Os índios, o Estatuto e a responsabilidade penal

Imagine aquele índio que vive isolado, possui raros contatos com elementos de nossa sociedade, está com fome, vê um supermercado repleto de comida, pega o que lhe atrai, come e não paga. Neste caso ele responde pelo crime ou não?

Vamos lá.

Qualquer ato delituoso será respondido nos termos do nosso Código Penal - nosso código idoso que nasceu em 1940. Entretanto, responde pelo Código Penal aqueles que o Código Civil considera como capazes, da mesma forma que o Código Civil versa também sobre os incapazes; e no artigo 4º do referido Código consta no parágrafo único, ao tratar dos incapazes, que: A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. Esta legislação ainda não existe, mas a vida segue…

Para saber se o índio responde ou não pelo crime é preciso analisar o caso concreto. É necessário averiguar se, de acordo com sua cultura, costume e tradição, ele entendia o caráter ilícito de determinada conduta considerada crime em lei. Assim, muito embora para nós que estamos inseridos nesta nossa sociedade "o desconhecimento da lei seja inescusável" (art. 21, do CP), para os índios que vivem noutra cultura "o erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena". Nós, muito embora não saibamos o conteúdo das leis, nem em que artigo do código está dito que fazer tal coisa é errado, sabemos, pois o costume nos indica, o que é certo ou não. Com os índios, entretanto, não ocorre o mesmo - por isto eles podem fazer algo achando que não está fazendo nada de errado…

Este pensamento é atual, advindo com a Constituição Federal de 1988 que privilegia e protege a diversidade cultural.

Muito embora eu reconheça problemas no Estatuto dos Índios (Lei 6.0001/73)- que não poderia mesmo ser progressivo, posto que gestado no útero da Ditadura Brasileira, e por isto é extremamente integracionista - considero como utilizável, para fins práticos, o exposto no Artigo 4º do referido Estatuto:

Art 4º Os índios são considerados:

I - Isolados - Quando vivem em grupos desconhecidos ou de que se possuem poucos e vagos informes através de contatos eventuais com elementos da comunhão nacional;

II - Em vias de integração - Quando, em contato intermitente ou permanente com grupos estranhos, conservam menor ou maior parte das condições de sua vida nativa, mas aceitam algumas práticas e modos de existência comuns aos demais setores da comunhão nacional, da qual vão necessitando cada vez mais para o próprio sustento;

III - Integrados - Quando incorporados à comunhão nacional e reconhecidos no pleno exercício dos direitos civis, ainda que conservem usos, costumes e tradições característicos da sua cultura.

Com esta divisão penso que o problema fica menos abstrato quando no momento de sua solução. Assim, os isolados são plenamente inimputáveis; os em vias de integração devem passar por uma aferição de responsabilidade; e os já integrados são plenamente responsáveis.

Importante: estes últimos devem ser responsáveis pois, ainda que conservem usos, costumes e suas tradições, por estarem já incorporados à comunhão nacional (não curto este termo! Parece que índio não faz parte de nossa nação...) começam a fazer parte daquele rol de pessoas que não tem desculpa não conhecer a lei - e isto não elimina, de forma alguma, a garantia de pluralidade étnica e cultural no país.

 
 

Mas ainda é pouco julgar se eles têm conhecimento da lei ou não, se têm consciência ou não do ilícito. É preciso discutir quem faz este julgamento. Neste sentido faço campanha pela aprovação do Estatuto das Sociedades Indígenas, projeto de 1991 e parado no Congresso, que em seu artigo 90 diz:

Nos processos criminais contra índios, o juiz ordenará a realização de perícia antropológica, que determinará o grau de consciência de ilicitude do ato praticado, para efeito da aplicação do disposto no artigo 21 do Código Penal.

Muito bom, não é? Nada de avaliação psiquiátrica, como se índio estivesse debaixo do pesado manto do artigo 26 do Código Penal que trata dos incapazes por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado; eles serão avaliados por antropólogos, para avaliar a questão do ponto de vista cultural. E é óbvio o motivo: punir um índio que comete um ato, em situação em que ele desconhece tratar-se de conduta tipificada como crime pela cultura dominante, é penalizá-lo por ter uma cultura diferente.

Assim, a priori, nenhum índio responde pelos crimes do nosso Código Penal se não restar comprovado o conhecimento de nossas leis e costumes, pois ele não é obrigado a viver como nossa cultura impõe.

 
 

Pontos interessantes:

  • Crimes de menor gravidade praticados por indígenas devem ser solucionados pelos grupos tribais.

Art. 57 da Lei 6.001/73 - Será tolerada a aplicação, pelos grupos tribais, de acordo com as instituições próprias, de sanções penais ou disciplinares contra os seus membros, desde que não revistam caráter cruel ou infamante, proibida em qualquer caso a pena de morte.

  • Se o fato acontece fora da aldeia ele será julgado pelo nosso Poder Judiciário. Qual? A justiça estadual.

Conclusão

O Brasil ainda tem muitos índios, pois de acordo com o Censo de 2010 sobre o assunto, nosso país tem 896,9 mil indígenas em todo o território nacional, somando a população residente tanto em terras indígenas (63,8%) quanto em cidades (36,2%) e o debate cada vez mais profundo e constante sobre este assunto é de suma relevância e interesse para todos nós que somos filhos da galera que chegou aqui, invadiu a terra deles e matou seus ancestrais.

Fontes para pesquisa

DUCLERC, Elmir. Por uma teoria do Processo Penal, p. 67 a 72

Criminalização e Situação Prisional de Índios no Brasil

Estatuto das Sociedades Indígenas - PL 2057/91

IBGE - Indígenas

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