Em meio a uma das piores crises financeiras desde que começaram a atuar no Estado, há mais de 50 anos, as Apaes de Santa Catarina deixaram de receber R$ 110,06 milhões em repasses do governo estadual nos últimos cinco anos. É o que aponta o relatório do Tribunal de Contas do Estado (TCE) sobre a contabilidade da administração estadual em 2015. De acordo com o corpo técnico do órgão, que recomendou, em junho, a aprovação das contas com 14 ressalvas, foram R$ 24,23 milhões a menos apenas no ano passado.
No entendimento dos auditores, a retenção do dinheiro descumpre o que determina a legislação. Desde a aprovação da chamada "lei Júlio Garcia" — em referência ao então presidente da Assembleia Legislativa e hoje conselheiro do TCE —, em dezembro de 2005, ficou estabelecido que 16,7% do dinheiro destinado aos programas desenvolvidos pelo Fundosocial seriam repassados às Apaes. A conta, no entanto, não vem fechando. Pelos cálculos do TCE, sobre uma base de R$ 320,79 milhões do ICMS Conta Gráfica em 2015, as Apaes catarinenses deveriam ter recebido R$ 53,72 milhões. O repasse efetivo, no entanto, foi de R$ 29,27 milhões, ou 54,78% do valor legal, com R$ 24,23 milhões a menos.
O mesmo panorama se repete desde 2011, quando deixaram de ser repassados R$ 19,26 milhões. A situação continuou em 2012 (R$ 18,43 milhões), em 2013 (R$ 23,78 milhões) e em 2014 (R$ 24,36 milhões), totalizando R$ 110,06 milhões em cinco anos.
Repasses em queda em 2016
Presidente da Federação da Apaes de Santa Catarina, Julio Cesar Aguiar diz estar ciente dos apontamentos do TCE e espera que o dinheiro possa ser reavido pelas instituições — ou que a lei passe a ser cumprida integralmente daqui para frente. A realidade, porém, é outra. Neste ano, o dinheiro repassado pelo governo às 190 Apaes catarinenses tem caído mais de 20% em relação a 2015. A expectativa é que as instituições recebam em tornou de R$ 23 milhões até o fim do ano.
— Claro que isso dá um impacto em todas (as Apaes). É um dinheiro que elas já estavam esperando para fechar seus caixas — diz Aguiar.
Diante dessa queda, aliada à diminuição, em muitos casos, dos repasses municipais, a solução tem sido buscar fontes alternativas de receita. De acordo com Aguiar, as Apaes tem aumentado o número de eventos beneficentes, como festas e feijoadas. O objetivo principal é não prejudicar o atendimento aos alunos.
— Buscamos fazer o melhor possível para que eles não sejam prejudicados. Nossa prioridade é achar maneiras de cobrir essa falta de recursos. Estamos vivendo uma crise e as doações também diminuem. É natural em um momento como esse — conta Aguiar.
Governo contesta TCE
Embora o TCE tenha feito ressalvas semelhantes quanto à retenção do dinheiro das Apaes em anos anteriores, o governo estadual contesta os cálculos feitos pelo órgão. Segundo a Secretaria de Estado da Fazenda (SEF), da base de cálculo, devem ser retiradas "vinculações constitucionais e legais", como os valores repassados a municípios e outros poderes, além de Ministério Público e Udesc. Além disso, a SEF aponta que nem toda a base de cálculo do ICMS Conta Gráfica (R$ 320,79 milhões em 2015) deveria ser considerada no repasse às Apaes, pois as contribuições das empresas para o Fundosocial podem ser consideradas "até o limite de 6% (seis por cento) do valor do imposto mensal devido". Isso não impede, porém, doações maiores. Entretanto, tudo que exceder os 6% deverá ser destinado "para financiar programas e ações de desenvolvimento, geração de emprego e renda, inclusão e promoção social, no campo e nas cidades, inclusive nas áreas de cultura, esporte e turismo", segundo a lei Júlio Garcia.
Para acabar com essas dúvidas, o governo encaminhou à Alesc o projeto de lei 531/2015, que tramita em regime de urgência. O texto, escrito após ressalva do TCE sobre os repasses às Apaes em 2014, prevê expressamente a dedução da base de cálculo para repasses às instituições da participação dos poderes e órgãos sobre as referidas receitas.
Em relação aos argumentos do governo estadual, o corpo técnico do TCE diz que, mesmo que fosse deduzido da base de cálculo o repasse aos poderes e órgãos (que representa 21,88%), "ainda permaneceria descumprida a determinação legal, posto que os repasses permaneceriam insuficientes pelo montante de R$ 12,5 milhões". A assessoria de comunicação do órgão informa ainda que o caso será acompanhado por meio de processo de monitoramento.
Números da Apae em SC
- 190 unidades
- 19 mil alunos
- 5 mil funcionários
- 6 mil dirigentes-voluntários
- 25 mil voluntários não-dirigentes