RIO - No último dia 2, o ajudante de pedreiro Amarildo de Souza completaria 46 anos. Mas ele desapareceu no dia 14 de julho de 2013, depois de ser levado por policiais militares até a base da UPP da Rocinha, na Rua 2. Seu corpo nunca foi encontrado. Ontem, pouco mais de uma semana depois do aniversário, a juíza Maria Paula Galhardo, da 4ª Vara de Fazenda Pública do Rio, condenou o estado a pagar R$ 500 mil à viúva Elizabeth da Silva e a cada um dos seis filhos do casal, como informou Ancelmo Gois em seu blog. O governo ainda terá que pagar R$ 100 mil para cada um dos três irmãos de Amarildo. O valor total ficou em R$ 3,8 milhões. Além disso, a juíza manteve o pagamento de um salário mínimo à viúva até completar 68 anos, e, aos filhos, até 25 anos, como havia sido determinado em novembro de 2014. O estado informou que ainda não foi notificado da sentença.
De acordo com a decisão, a juíza considerou que não há dúvidas de que os policiais são culpados pela morte do ajudante de pedreiro, que era morador da comunidade.
Para o advogado da família, João Tancredo, o valor da indenização está abaixo do esperado, além de não contemplar a mãe de criação de Amarildo, Jurema Barreira, e a sobrinha, Michele Lacerda.
— A juíza não deu a indenização para a Dona Jurema e para a Michele, conforme pedimos. Como o estado deve recorrer da decisão, é provável que a família também recorra, para reforçar que queremos o pagamento também às duas — disse.
O advogado discorda do argumento da juíza para fixação do valor da indenização. Na sentença, a magistrada afirma que levou em consideração o momento de crise financeira pelo qual o estado passa.
— Esse não é um critério adequado. A crise vai passar, mas o valor não vai mudar. Se houver mesmo recurso do estado, vamos pedir o aumento da indenização. Se considerarmos a gravidade do crime, o valor é pequeno — afirma.
Para Michele, sobrinha de Amarildo, o valor da indenização não é suficiente para aplacar a dor da família. Mas ela afirma que os parentes do ajudante de pedreiro ficaram satisfeitos em ver que a Justiça reconheceu a culpa do estado.
— É claro que essa é só a primeira sentença. Com certeza, o estado vai recorrer, vai fazer de tudo para não pagar, mas é importante o reconhecimento da Justiça de que o estado destruiu a nossa família — diz ela.
“NÃO PAGA O PREÇO DE UMA VIDA"
Michele reclama ainda que o benefício fixado em um salário mínimo em 2014 tem sido pago apenas no décimo dia útil, como o salário dos servidores, e que o 13º ainda não foi pago integralmente.
— Acho que valor algum paga o preço de uma vida. Na minha opinião, o que a juíza decidiu é pouco. Sabemos que a família vai demorar muito a ter esse dinheiro nas mãos ainda. Além disso, nunca vamos ter de volta o abraço dele. Preferia não ter dinheiro, mas ter o meu tio presente. No dia 2 foi aniversário dele e ficamos nos lembrando como ele era, em vez de comemorarmos a data com ele — afirma Michele.
Em fevereiro deste ano, 12 policiais militares foram condenados pelo desaparecimento e morte de Amarildo. Todos receberam aumento de pena por serem agentes públicos e terem praticado o crime no exercício de suas funções. O Major Edson Raimundo dos Santos recebeu a maior pena: 13 anos e sete meses de prisão. Para a Justiça, ele, que era o comandante da UPP, “foi o mentor intelectual da tortura” contra Amarildo. O tenente Luiz Felipe de Medeiros foi condenado a 10 anos e sete meses de prisão; o soldado Douglas Roberto Vital Machado, a 11 anos e seis meses; os soldados Marlon Campos Reis, Jorge Luiz Gonçalves Coelho, Jairo da Conceição Ribas, Wellington Tavares da Silva, Fábio Brasil da Rocha da Graça e Felipe Maia Queiroz Moura receberam pena de 10 anos e quatro meses. Rachel de Souza Peixoto e Thaís Rodrigues Gusmão foram condenadas a 9 anos e quatro meses.