Seis pessoas deram fim à própria vida em São Bento do Sul no ano passado
29 de janeiro de 2011, sábado, aproximadamente 6:00, bairro Progresso: um estudante de 18 anos pendurado pelo cinto no banheiro foi encontrado pelo pai.
03 de março de 2011, quarta-feira, aproximadamente 16:00, bairro Alpino: um senhor de 77 anos pendurado por uma corda amarrada na janela foi encontrado pelo sobrinho.
29 de abril de 2011, sexta-feira, aproximadamente 14:00, bairro Serra Alta: uma operadora de máquina de 48 anos foi encontrada pela filha e levada para o hospital Sagrada Família – onde acabou falecendo – após ingerir veneno.
21 de julho de 2011, quinta-feira, aproximadamente 14:00, bairro Progresso: um mecânico de 34 anos se matou com uma faca de cozinha, após a primeira tentativa fracassada (com uma corda), impedida pela mãe.
28 de julho de 2011, quinta-feira, aproximadamente 19:30, bairro 25 de Julho: um operador de máquinas de 28 anos foi encontrado sem vida e com um revólver ao lado pelo irmão.
22 de dezembro de 2011, quinta-feira, horário incerto, bairro Serra Alta: um operador de máquinas de 46 anos foi encontrado enforcado pelo afilhado – também após tentativa fracassada, pois no dia anterior havia jogado o carro contra um poste.
Estes foram os seis casos de suicídio registrados em São Bento do Sul no ano passado, contra nove homicídios ocorridos no município. Assunto dos mais delicados, o suicídio é tratado como tabu pela própria imprensa. “Porém, é um tema que tem que ser abordado”, observa o psicólogo e psicanalista Robson Mello. “Precisamos de mais profissionais engajados – precisamos de mesas redondas, seminários e debates envolvendo este tema, que é um tema muito sério”, destaca. Ele conta que ao chegar à região, oriundo do Rio de Janeiro, há mais de dez anos, deparou-se com um mito: fortes ventos, na cultura popular, significavam que alguém havia se enforcado. “Isso faz parte do imaginário da população, o que é assustador, porque tende a atravessar gerações”, constata. Robson frisa que não existem pré-disposições genéticas para o suicídio. “É, sobretudo, uma questão psicológica e social”, ensina.
Robson Mello espanta-se com uma realidade: em 2001, quando chegou à região, a maioria dos casos de pessoas que tiraram a própria vida era de adultos. “Hoje temos mães e pais que choram suicídios de filhos adolescentes”, diz. Ele próprio chegou a atender, no mesmo dia, a mãe de um e a namorada de outro adolescente que haviam cometido tal ato. Mesmo tendo atuado e estando atuando com casos do gênero, o profissional admite: “A gente fica sem resposta”. Exceto quando as vítimas deixam, por exemplo, cartas a familiares e amigos. “Caso contrário, permanece um silêncio, uma dor, uma ferida que nunca vai se fechar para quem fica”, analisa.
DIREITO DE VIVER E DIREITO DE...
O Complexo de Édipo, descrito por Sigmund Freud, pai da psicanálise, é um dos fatores do suicídio. A própria psicanálise aponta que “o sujeito tem o direito de viver e também o direito de morrer”, nas palavras de Robson Mello. “É um ato consciente de não querer mais viver”, destaca, lembrando que as diferentes religiões abordam o tema de maneira distinta. Na católica, por exemplo, tem-se como regra que “só Deus pode tirar a vida” e que quem se mata “vai para o inferno”. Já na islâmica, os mais extremistas, que chegam a cometer atentados suicidas para se tornarem mártires, afirmam que têm à disposição sete virgens no céu.
O tema é, de fato, complexo. Se para alguns o suicídio é considerado um “ato covarde”, para outros, “no inconsciente, ronda como algo heróico”. O psicólogo frisa que aqui, na realidade local, questões como a formação e a educação do indivíduo podem ser decisivas. Dependendo da fragilidade nesse aspecto, “vai ser mais difícil abraçar a vida em momentos difíceis”, narra. Robson enfatiza que há pessoas – com problemas depressivos, por exemplo – que “tomam inúmeros remédios, mas não se tratam psicologicamente”. Ele deixa um alerta: “As famílias deveriam começar a pensar em metas e objetivos de vida”.
COMO PREVENIR?
O profissional ouvido pelo Evolução, não obstante, aponta para a seguinte questão: “A vida tem que ser mais do que só trabalhar, acumular riquezas, ter casa e carro, porque, caso contrário, os filhos tendem a repetir esse modelo”. Ele fala da questão preventiva. “Como prevenir casos de suicídio? As pessoas têm que aprender a ser mais felizes, a ter bom humor. Tem a questão da arte, que pode ajudar. É preciso também ter mais contato com a natureza e praticar esportes”, exemplifica. “Precisamos da leveza, da beleza, da sensibilidade. Quem não tem isso fica rígido, travado”. Como prevenção, o próprio tratamento psicológico e mesmo o tratamento psiquiátrico, com medicamentos, são indicados.
ENTIDADE PODE AJUDAR
Além do tratamento profissional, quem também pode dar uma força são os voluntários do Centro de Valorização da Vida (CVV) de Rio Negrinho. A entidade está presente no município rio-negrinhense há oito anos e funciona diariamente, das 15:00 às 23:00, inclusive finais de semana e feriados, pelo telefone 3644-4693. Também há atendimentos feitos pessoalmente, no posto da entidade, localizado na estrutura do terminal rodoviário. Nesse caso, os atendimentos são das 15:00 às 18:00. O trabalho é feito no mais completo sigilo, através dos quatorze voluntários disponíveis, a maioria mulheres. Uma delas, que é inclusive uma das fundadoras do CVV em Rio Negrinho, destaca que quem presta este tipo de atendimento “tem que estar preparado”, “não pode ser vulnerável” e deve-se utilizar de “empatia e tranquilidade”, pois muitas vezes sequer conhece quem está do outro lado da linha. “É uma felicidade poder ajudar quem está sofrendo”, afirma a voluntária. Em média, o posto da entidade em Rio Negrinho recebe vinte e oito ligações por mês.
De acordo com a Wikipédia, no Brasil, 4,9 pessoas a cada 100 mil morrem por suicídio por ano, uma das menores médias do mundo. “Ao contrário do resto do mundo, onde é mais comum entre adultos, no Brasil há uma prevalência entre os jovens entre 15 e 24 anos. Entre os Estados, o Rio Grande do Sul é o que tem a maior taxa, 9,88 para 100 mil”, revela a fonte, acrescentando que a cidade brasileira com o maior índice é Venâncio Aires/RS, com mais de 40 casos a cada 100 mil habitantes. Em várias fontes, porém, o município de Pomerode/SC é apontado como a “capital brasileira do suicídio”.
NÚMEROS EM SC
Dados da Secretaria de Estado de Segurança Pública obtidos pelo Evolução trazem os números de casos de suicídio registrados em 2011 em Santa Catarina. Por exemplo: Araranguá (2 ocorrências), Balneário Camboriú (2), Blumenau (24), Brusque (5), Canoinhas (3), Chapecó (11), Criciúma (22), Florianópolis (28), Jaraguá do Sul (7), Joinville (24), Lages (18), Mafra (4), Palhoça (11), Pomerode (6), Rio Negrinho (4), Tubarão (9) e Xanxerê (6). Entretanto, é preciso considerar o número de habitantes (vide quadro “Onde e quantos”). Em Araranguá, com 61 mil habitantes, foram 2 casos. Em São Bento do Sul, que tem 14 mil habitantes a mais, foram 6 suicídios registrados. Em Pomerode, que tem 47 mil habitantes a menos, também foram registrados 6 casos. Por outro lado, em Jaraguá do Sul houve um caso a mais (7 suicídios), ainda que o município tenha 143 mil habitantes – 68 mil a mais que São Bento. (E.L.)