Mundo em ebulição – Uma resposta
Olá, Sr. Pedro A. Skiba e a todo o pessoal da redação. Sua última coluna “Reticências” foi realmente muito boa, mas creio que ficaram alguns pontos que merecem um pouco mais de discussão.
Realmente parece haver algo de muito desagradável na natureza humana, que vem se prolongando por tempo demais. Sejam as arenas da antiguidade, em que os cidadãos assistiam a sangrentos espetáculos em que várias pessoas morriam dolorosamente para “entretê-los”, seja como ocorre hoje, quando as pessoas assistem a barbáries na segurança de seus lares, com os filhos a tiracolo.
Qualquer pessoa veria aí mais um motivo para perder a fé na humanidade. Afortunadamente, não sou uma delas.
O campo da religiosidade é realmente minado. Creio que a exposição a que o Sr. se refere é a campanha da ATEA (Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos), através de outdoors com as esclarecedoras mensagens “Religião não define caráter” (junto a uma imagem de Hitler, um crente, e de Charles Chaplin, um descrente) ou “Com Deus, tudo é permitido” (e uma imagem do ataque ao World Trade Center).
Como associado da ATEA, bem como da SBCR (Sociedade Brasileira de Céticos e Racionalistas), venho aqui apresentar minha defesa. Assim como alguns dos meus colegas e amigos, não combato o cristianismo ou qualquer outra orientação religiosa, desde que se mantenham restritas ao seu campo. Quando começam a querer ensinar “pseudoteorias” nas escolas, ou incitar o ódio a minorias, aí merecem toda a minha condenação.
Nunca utilizo a palavra “Deus”, ao invés, uso “deuses”, afinal considero todos eles mitos e não vejo motivo para usar um nome próprio com inicial maiúscula para algo que não reconheço como real. Uso “graças a deus”, “minha santa genovévia”, entre outros, como interjeições que são, por força do hábito. No meu leito de morte, é provável que vá invocar qualquer coisa que possa diminuir meu tormento, seja a grande URI (Unicórnia Rosa Invisível) ou o Monstro de Espaguete Voador, entre outros. E desfruto dos feriados religiosos pelo mesmo motivo de todos: sendo o Estado Laico, nenhum seguidor de determinada religião pode ser beneficiado com um feriado, em detrimento de quem não segue tal religião.
“Basta não contar para ninguém”. Uma revisão da política do “Don’t ask, don’t tell”, que até há pouco tempo vigorava nas forças armadas dos EUA, que dizia que militares gays poderiam servir, se não dissessem a ninguém acerca de sua orientação sexual?
Só se esconde algo quando se considera esse algo errado. Se determinadas seitas e religiões podem comprar espaço nas programações televisivas, ou então na mídia impressa, não vejo por que esse direito não se estenda aos descrentes. Respeito pessoas religiosas e espero esse mesmo respeito em retribuição. Se isso não ocorre, a revolta de minha parte ou dos meus colegas ateus é completamente justificável. Religião, sendo basicamente um conjunto de idéias, pode e deve ser alvo de discussão, assim como certas teorias científicas e determinadas filosofias. Só temos motivos para nos preocupar quando os a argumentação perde lugar para a violência ou quando são seres humanos os alvos, ao invés de idéias.
E, repetirei até a exaustão, ser gay não é uma questão de opção. A única opção que existe nesse sentido é entre se esconder feito rato (não contando a ninguém), ou bravamente abraçar sua sexualidade e viver sua vida. Repito uma frase que já usei antes, da qual nunca me canso: Enquanto for entre dois ou mais adultos, de maneira consentida e na privacidade de seus lares, tá valendo!
Não há motivo para uma passeata do orgulho hétero. Todos os dias são dias do hétero, e toda vez que um garoto sai por aí de mãos dadas com sua namorada é uma passeata do orgulho hétero. A motivação das Paradas do Orgulho Gay é o fato de que muitos dizem que não nos é permitido andar de mãos dadas, beijar-se em público, etc. Aí fico com uma frase atribuída a uma fictícia drag queen: “É mais difícil usar um vestido por uma hora, do que um terno pela vida toda" (Godiva, da memorável série Queer as Folk).
Por fim, essa última edição do Jornal Evolução primou pelas reportagens referentes a musica e ao estilo de vida punk, que pessoalmente admiro.
Grande abraço!
Odirlei Dias