Pouco antes de conceder palestra, na semana passada, a vários oficiais da Polícia Militar, o promotor de Justiça - que solicitou que a imprensa se retirasse da mesma -, deu a seguinte entrevista ao Evolução. Oriundo da Comarca de Canoinhas, Wagner Kuroda também já atuou em Rio Negrinho. Ele falou, na rápida conversa com a Reportagem, a respeito das mudanças no Código de Processo Penal.
EVOLUÇÃO - Quem conversa conosco nesta ocasião é o promotor de Justiça Wagner Kuroda, da 3ª Promotoria de São Bento do Sul, responsável pelas curadorias Criminal, Meio Ambiente e Controle Externo da Atividade Policial. Do que se trata essa palestra que o senhor vai conceder aos oficiais da PM nessa ocasião?
WAGNER KURODA - A convite do tenente-coronel Amarildo (de Assis Alves, comandante do 23º Batalhão de Polícia Militar), vou falar sobre as recentes mudanças que tivemos na questão das prisões, da liberdade provisória e das fianças.
EVOLUÇÃO - Sobre as alterações do Código Penal, certo?
WAGNER KURODA - Isto. As modificações no Código de Processo Penal entraram em vigor no dia 5 de julho.
EVOLUÇÃO - Basicamente, qual é sua visão a respeito dessas mudanças?
WAGNER KURODA - O que a legislação deixa bem claro é que a pena seja a última medida a ser aplicada. Ela traz alternativas outras, antes de chegar à decretação da prisão. Na verdade, a intenção da legislação é evidente: esvaziar a superlotação dos presídios em relação a essas prisões, chamadas processuais, quando ainda não há uma sentença final a respeito.
EVOLUÇÃO - Quando não tem o trânsito em julgado...
WAGNER KURODA - Exatamente - quando não há trânsito em julgado. Nos crimes em que for cominada a pena de até quatro anos, o juiz não pode mais decretar essa prisão processual. Obrigatoriamente, ele terá que conceder a liberdade.
EVOLUÇÃO - Alguns setores da sociedade dizem que essas mudanças influenciarão no aumento da impunidade. O senhor também vê dessa forma?
WAGNER KURODA - É difícil ter uma opinião nesse sentido. É melhor aguardar para ver o que, de fato, vai ocorrer. Sem dúvida alguma, porém, nos crimes que têm até essa pena (quatro anos), aquele medo que se tinha, aquele receio de que a prisão seria decretada, vai acabar. De antemão, o infrator já vai saber: "Ah, o crime tem pena de até quatro anos. Posso fazer o que quiser, porque não vou ser preso". Sob esse prisma, talvez seja possível termos esse resultado. Porém, apenas o tempo dirá.
EVOLUÇÃO - Como é uma mudança recente, é melhor aguardar?
WAGNER KURODA - É melhor aguardar. Para se ter uma ideia, por exemplo, nos crimes de furto - que não sejam qualificados - não vai mais caber a prisão. É o crime que mais afeta a toda a sociedade.
EVOLUÇÃO - Este seria um dos aspectos negativos. Quais seriam os pontos positivos com essas mudanças?
WAGNER KURODA - Essa mudança consagra aquilo que já está na Constituição, ou seja, a presunção de inocência - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da decisão. Não vai haver essa antecipação da pena - que é o que muito se rebatia, afirmando que essa prisão processual apresentaria uma condenação sem sentença definitiva. Outro aspecto positivo que se vê é a aplicação de algumas medidas que não estavam previstas na lei. Por exemplo, o delito praticado por funcionário público no exercício da profissão. Ao invés de o juiz decretar a prisão, o juiz pode decretar que esse servidor se afaste das suas atividades. Então, se alcançaria quase o mesmo efeito da prisão, mas seria uma medida mais branda, que também vai implicar na redução da superlotação dos presídios.
EVOLUÇÃO - Estuda-se a possibilidade, já com a realização de audiências, de se construir uma UPA - Unidade Prisional Avançada em São Bento do Sul. O senhor acha que é uma boa para o município?
WAGNER KURODA - Acho que - como se diz - é um mal necessário. Na verdade, como já havia ressaltado em outra oportunidade à imprensa, a comunidade tem que verificar o que é preferível: o infrator solto na própria comunidade ou preso provisoriamente em uma UPA. Então, vejo que ela é necessária. O problema da superlotação é muito grave - acredito que a unidade virá num momento muito importante.
EVOLUÇÃO - O senhor está há poucos meses em São Bento do Sul, certo?
WAGNER KURODA - Estou em São Bento desde o dia 20 de junho.
EVOLUÇÃO - Já dá para ter um certo panorama da cidade ou ainda é muito pouco tempo?
WAGNER KURODA - Já dá para ter uma noção. Antes de vir para cá eu estava em Canoinhas, mas já tinha sido promotor em Rio Negrinho durante dois anos e meio. Então, eu já tenho uma ideia de como é a situação.
EVOLUÇÃO - E qual a maior demanda da Promotoria, hoje?
WAGNER KURODA - Como a minha Promotoria é muito específica, a demanda, de fato, são os processos criminais.
EVOLUÇÃO - Dentre os processos criminais, quais que têm se destacado?
WAGNER KURODA - É muito cedo para dizer o que se destaca mais, mas o que chama a atenção talvez seja o tráfico. Tenho constatado que, de fato, existem muitos processos de tráfico aqui na região - não imaginei que seriam tantos.
EVOLUÇÃO - Sinal que a polícia está agindo...?
WAGNER KURODA - Tráfico existe em todos os lugares, mas se há tantos processos, é sinal que a polícia está desempenhando a sua função.
EVOLUÇÃO - Principalmente em relação ao crack?
WAGNER KURODA - Está muito banalizado, né? Já são raras as apreensões de outras drogas que não o crack.
EVOLUÇÃO - Para encerrarmos, promotor. Até pouco tempo, quando se falava em drogas, em entorpecentes, se comentava muito sobre os vulgos "malacos". O que vemos hoje é que o crack - que está dominando em grandes, médias e pequenas cidades - está em todas as classes sociais. Então, acabou esse estereótipo. O senhor percebe isso também?
WAGNER KURODA - Acabou o estereótipo, realmente. Também se chega a uma constatação interessante: pessoas já de idade - que estariam livres do acesso à droga - estão começando a consumir também.