Delegado Marcus Vinicius (esq.) deu detalhes da investigação em coletiva nesta quinta-feira de manhã
Uma organização criminosa formada por agentes públicos e empresários da Grande Florianópolis para desviar recursos de subvenções sociais distribuídas pela Secretaria de Estado de Turismo Cultura e Esporte (SOL) foi alvo da Operação Atoleiro, da Diretoria Estadual de Investigações Criminais (Deic), deflagrada nesta quinta-feira em Florianópolis, São José e Biguaçu. Apesar de os investigadores não terem divulgado os nomes dos envolvidos, a reportagem apurou que o ex-deputado estadual Gilmar Knaesel (PSDB) é um deles.
De acordo com o delegado Marcus Vinicius Fraile, responsável pela Divisão de Crimes Contra o Patrimônio Público da Deic, um "ex-deputado" era o líder do grupo.
— Sem dúvida nenhuma o agente político chefiava a organização criminosa — afirma Fraile.
Ainda segundo o delegado, a organização desviou recursos da SOL entre 2008 e 2010. Neste dois anos, Knaesel era o secretário da pasta. Em junho de 2016, outra operaçãoprendeu o ex-parlamentar e mais quatro pessoas. Desta vez, no entanto, ele não está entre os sete detidos temporariamente. A Justiça negou o pedido de prisão preventiva contra ele e mais três assessores feito pela Deic. O entendimento da Polícia Civil é que o político e o trio estavam obstruindo a Justiça.
Por outro lado, Knaesel teve três imóveis e mais um carro sequestrados por medidas judiciais nesta quinta-feira, na etapa que é continuação da operação de 2016. Um caminhonete Hilux dele foi apreendida pela Polícia Civil. Um dos assessores dele também teve bens bloqueados: uma Montana e quatro imóveis. Os presos nesta quinta-feira, segundo Fraile, são dois empresários, um contador e mais quatro pessoas que integravam associações de fachada formadas para receberem recursos da secretaria.
Gilmar Knaesel era secretário da SOL entre 2008 e 2010, período das investigaçõesFoto: ANDRÉ KOPSCH / Divulgação
Como funcionava o esquema
As investigações começaram depois que o Ministério Público de Contas (MPC) do Tribunal de Contas do Estado (TCE) detectou irregularidades nas prestações de contas de entidades não-governamentais do recursos recebidos da SOL. Assim, em 2016 a Deic fez a operação Bola Murcha, em que integrantes do grupo criminoso teriam desviado R$ 69 mil por meio de uma entidade existente apenas no papel, chamada Sociedade Recreativa e Esportiva Mente Sã, Corpo São.
Fraile diz que depois deste inquérito do ano passado, foram abertos outros cinco procedimentos, que motivaram a ação desta quinta-feira. O delegado explica que foram detectadas outras cinco entidades criadas apenas para o desvio de recursos que, na época, chegaram a R$ 570 mil. Atualmente, avalia a Deic, este valor estaria próximo a R$ 1 milhão, com as atualizações monetárias.
O esquema passava pela destinação de valores da SOL através de subvenções diretamente para as entidades que faziam o pedido sob o argumento de que promoveriam eventos. No entanto, revela Fraile, nenhuma das dezenas de promoções realmente ocorreu. Ou seja, o dinheiro foi usado para outros fins pelos envolvidos na organização.
— Cinco associação se alternavam para receberem recursos. E todas elas são formadas pelos mesmos integrantes. Eles faziam prestações de contas de eventos que não aconteciam.
"Laranjas" eram cooptados para figurar como integrantes dessas associações criadas. Além disso, notas fiscais frias era compradas para "esquentar" o recebimento dos recursos públicos que deveriam ser aplicados em eventos ligados ao esporte à cultura. Um dos assessores de Knaesel, explica a Deic, era usado para falsificar os documentos na prestação de contas.
O nome da operação desta quinta-feira, chamada de Atoleiro, se refere a dois eventos de motocross criados de forma fictícia apenas para que recursos fossem solicitados à secretaria e depois desviados, segundo o delegado.
Dentro da investigação, a Deic encontrou nas prestações, entre outros fatos que chamaram a atenção, a existência de pessoas semianalfabetas que exerceriam funções como assessoria de imprensa. Na prática, entretanto, nada existia, nem as funções, muito menos os eventos.
Dos 11 envolvidos, ao todo, praticamente todos estão nos seis inquéritos abertos. Se indiciados, eles devem responder por peculato (dois a 12 anos de prisão), organização criminosa (três a oito anos, com aumento de pena por participação de funcionário público) e corrupção passiva (dois a 12 anos) em cada um dos procedimentos instaurados. Os investigadores não divulgaram os nomes dos envolvidos.
Contraponto
Advogado de Gilmar Knaesel, o advogado Marlon Charles Bertol diz que ainda não teve acessos ao processo que motivou as buscas e prisões desta quinta-feira. Somente depois disso ele pretende se manifestar sobre o sequestro de bens do ex-deputado. Em relação à afirmação do delegado que aponta o tucano como líder da organização criminosa responsável pelo desvio de recursos da SOL, Bertol contesta:
— Conheço o processo da operação do ano passado. O Tribunal de Justiça (TJ) não viu nada disso e ele ficou apenas cinco dias preso. O nome do Knaesel somente apareceu em contato entre terceiros, que citam ele. Somente uma linha. No ano passado o delegado falou que ele era o líder da grupo, mas não tinha nada disso.