Queijo com sotaque produz mais de 20 tipos de queijo (Foto: Divulgação)
Queijos de linhagem francesa, italiana e suíça são produzidos por fábricas e queijarias próximas às principais rodovias que cortam Santa Catarina. Esses empreendedores, que compartilham da mesma paixão pela tradição milenar, impulsionam o mercado com inovações e sabores peculiares do estado, com o objetivo de conquistar mais espaço e se consolidar com mais impacto no mercado nacional, dominado por Minas Gerais.
Para isso, além das experiências importadas da Europa, as apostas também são focadas em produtos tradicionais, mas com diferenciais que agregam valor, além de melhorias nas relações que envolvem o produtor rural.
Requinte europeu
A Gran Mestri, de Guaraciaba, no Oeste catarinense, tem um parque industrial com o maior estocador em queijos duros da América Latina. A empresa tem como carro-chefe a produção de queijo Grana Padano, originário da Itália, que possui consistência granulada e é muito utilizado em massas, saladas, risotos e também à mesa.
“Somos obcecados por qualidade e o produto é bom porque fazemos para nós mesmos comermos. O que sobra, nós vendemos”, brinca o idealizador e empresário Acari Luiz Menestrina, de 59 anos.
Descedente de italianos, ele se tornou um dos maiores fabricantes de queijo do Brasil ao investir em tecnologia e excelência na qualidade.
Mesmo diante da crise, a Gran Mestri atingiu um crescimento de 60% no faturamento, chegando a R$ 120 milhões. A projeção para este ano é chegar a R$ 170 milhões. “Estamos em um ano de extrema dificuldade, com restrição de crédito, juros altos e retração de consumo. Nos preparamos para enfrentar a crise e o crescimento ocorreu de forma sustentável. Isso ocorreu pelo diferencial na gestão, produção de alta qualidade e de custo baixo”, diz Menestrina.
A Gran Mestri foi criada em 2011 e sintetiza dez linhas de produção dentro de uma única indústria. “Foram anos de experiência no setor e muitas viagens para a Europa para conhecer as indústrias, equipamentos e ingredientes. Nossa estrutura atualmente fabrica as linhas de queijos tipo grana padano, pecorino romano, pecorino sardo, parmesão, montanhês, manteiga em lata e requeijão”, explica.
A matéria-prima vem de rebanho do próprio empresário e de produtores associados na região. É uma rede que envolve pelo menos 350 fornecedores de leite e 120 funcionários no quadro industrial, sem contar os terceirizados. O empresário aponta que, entre os objetivos das atividades desenvolvidas, estão a alta qualidade, a segurança alimentar, a produção de produtos saudáveis e a cultura de fazer bem feito.
O principal mercado consumidor das vendas é o Sudeste, onde a empresa investiu na instalação de um serviço de fracionamento que facilita a logística. Além disso, a empresa mira ocupar o lugar dos queijos diferenciados vindos de fora e planeja novidades, como o doce de leite. “Temos que estar atentos a todas as inovações e tendências de mercado", disse.
Conquista de novos paladares
Entre as estratégias de vendas está o showroom localizado no caminho turístico da fronteira da cidade sede, na BR-163, onde os visitantes conseguem conhecer a linha de produção da Gran Mestri, além de degustar os produtos da linha.
“O trabalho foi grande e ajudou a transformar o Oeste catarinense numa importante bacia leiteira, a que mais cresce no país. Hoje, 80% das famílias rurais têm o leite como principal fonte de renda. Produzimos mais de 3 bilhões de litros de leite ao ano, isso é mais do que produz o Uruguai, e todo o processo é composto por pequenos produtores”, explica.
Rota do leite
O Laticínio Santa Bárbara é outro exemplo de empresa que contribui para a representatividade da atividade econômica da cadeia leiteira regional. A empresa, que atua na região Oeste, está localizada em Lacerdópolis, na SC-150, km 103. Em 2005, iniciou as atividades com quatro pessoas e atualmente conta com 30 colaboradores.
Laticínio Santa Bárbara fica em Lacerdópolis (Foto: Divulgação)
Segundo o sócio-diretor Edson Luiz Tessaro, de 38 anos, entre os nichos explorados estão também os que concentram maior valor agregado, como as linhas voltadas para as restrições alimentares. “Isso nos abre portas para expandir no mercado”, disse.
Além disso, na área da gestão a empresa investe em programa de fidelização de produtores e na implantação de um novo software que proporcionara maior controle no processo produtivo e acompanhamentos dos custos de produção. Para 2016, Tessaro estima que deve atingir a meta de crescimento em 22%. O faturamento não foi divulgado.
Artesanal
Do outro lado do estado, na BR-101, na saída do Morro do Agudo, em Paulo Lopes, na Grande Florianópolis, a mestre queijeira Elisabeth Schober comanda a Queijo com Sotaque, linha artesanal baseada na tradição francesa que produz mais de vinte tipos do derivado do leite, entre eles o reblochon e o camembert.
A inspiração dos queijos é francesa, pátria de adoção de uma das sócias e idealizadoras da queijaria, Elisabeth Schober, 54 anos, nascida na Áustria, criada na França e que se mudou com os filhos para o Brasil por conta das belezas naturais do litoral catarinense. “Quando vim fazer turismo, me encantei e depois notei que por aqui não tinha tanta variedade de queijo e isso seria uma oportunidade de negócio”, disse.
Aos 17 anos, Elisabeth disse que aprendeu o funcionamento da base da produção de queijo durante um intercâmbio em fazendas francesas. “Fazer queijos é uma coisa mágica porque dá para olhar e ver a matéria mudando. Meus pais não queriam que eu estudasse agricultura e acabei cursando administração, mas não me dei bem. Eu tinha me apaixonado, queria mesmo era fazer queijo”, lembra.
Prioridade para leites orgânicos
A Queijo com Sotaque foi fundada em 2013, em parceria com os amigos locais Adílson Adílio de Sousa e Diego Adílson de Sousa, pai e filho. Com uma estrutura pequena e artesanal, a produção busca manter uma estrutura sustentável e vem ganhando reconhecimento na produção de queijos nobres, que trazem como diferencial o sabor, a técnica e fermentos.
A mestre Elisabeth Schober trouxe da Europa o conhecimento para fabricar queijos (Foto: Divulgação/Queijo com Sotaque)
“Gosto de fazer queijos e ter tempo para participar de todos os processos, inclusive das vendas”, explica Elisabeth. Os produtos são feitos com ingredientes e material orgânico.
Apreciados pelo público das classes A e B, a empresária conta que os queijos da marca não sofreram nem de longe os impactos da retração no consumo, o que reflete a tendência do mercado atual da alimentação no estado.
Nobreza
A mestre explica que os produtos possuem técnicas legítimas da França. “É um queijo fino com receita, fabricação e cura francesa. Sem conservantes, aditivos, estabilizantes e que também carrega os valores daqui”, disse.
O nome "Queijo com Sotaque" surgiu como uma brincadeira. Elisabeth conta que quando começou a produção, os amigos falavam: "Esse queijo aí não é bem brasileiro, saiu com sotaque".
Para projetos futuros, a fundadora tem planos de colocar em prática um projeto de pesquisa, que já está sendo elaborado em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), para a implantação de uma biblioteca para fornecer informações para laticínios de todo o país e também o desenvolvimento de trabalhos com os produtores para melhoria da qualidade do leite.
Novos mercados
Em Pomerode, no Vale do Itajaí, os irmãos Juliano e Bruno Mendes produzem queijos artesanais fundidos. A Pomerode Alimentos foi adquirida em 2013 pela família Mendes, que passou a carregar o legado do famoso Kraeuterkaese, o tradicional creme de parmesão com erva fina inventado na Suíça.
Os irmãos fundadores da Cervejaria Eisenbahn, responsável por uma grande mudança no mercado nacional de cervejas artesanais, pretendem levar o conhecimento adquirido no ramo cervejeiro para os queijos, apostando em harmonizações com a bebida.
Os irmãos Bruno e Juliano, da família Mendes, estão à frente da Pomerode Alimentos (Foto: Angelo Virgílio/Divulgação)
A dupla resolveu investir para encontrar um espaço para queijos especiais no gosto do brasileiro. Desde a aquisição, foram feitos trabalhos para renovar toda a identidade visual, com ampliação da linha de produtos e reforço na distribuição.
Para o administrador Juliano, de 41 anos, Santa Catarina oferece um mercado consumidor de alto poder aquisitivo e exigente. “Isso permite às empresas daqui criarem e desenvolverem produtos de melhor qualidade e com diferenciais, que trazem como consequência maiores possibilidades de crescimento e maximização das margens de lucro”, disse.
Ao analisar o cenário atual, Juliano explica que, com a crise, os consumidores passaram a comprar com mais critério, observando nas gôndolas não somente o valor unitário do produto, mas também o valor por quilo ou por litro. “Esta mudança nos permitiu aumentar consideravelmente a venda dos nossos produtos em embalagens maiores, como os stand up pouches, de 250g, que têm um preço por quilo bem inferior aos das bisnaga de 90g, nossos produtos de maior venda”.
Para aproveitar as novas tendências e a mudança de consumo, a empresa busca desenvolver uma estratégia que envolve novos materiais de apoio para equipe de vendas, exposição e divulgação. “Investimos também em degustações nos pontos de venda, levando diretamente ao consumidor a oportunidade de provar nossos produtos sem necessariamente ter que comprá-los”.
A expectativa para 2017 é dobrar a capacidade de produção e colocar no mercado uma nova linha de queijos especiais, após a crise geral de 2016. Para a recuperação, a empresa está de olho no mercado de fora e está nas tratativas iniciais para começar a exportar.