Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta
CRP 12/07911
Antes de intitular a crônica de hoje, pensava em qual tema escrever. Não sabia ao certo se comentava sobre a violência, educação, o amor. Foi quando percebi o quanto estava atento – e assim fixo, estático – para desenvolver o texto.
E ao me distanciar um pouco das linhas ainda em branco, pude escutar os pássaros que gorjeavam sobre o telhado, observar que o sol entrava pela janela, como o vento chacoalhava as cortinas e dobrava os ramos das árvores no quintal.
E me dei conta nesse momento que estava só!
Estava só, embora, não estivesse sozinho, pois na minha cabeça estava sempre dialogando com as pessoas que iriam ler a coluna de hoje, estava com os meus co-autores.
– Pronto! – Pensei. É a respeito disso que vou escrever. Sobre a solidão.
Não conseguiria escrever com barulhos, com a constante circulação das pessoas, então, nesses momentos, me distancio. Procuro a solidão, contudo, ainda não me sinto sozinho.
E mesmo procurando a solidão, nunca fui solitário.
E como sei que tantas pessoas a procurem, a solidão, no sentido da autoconsciência para o desenvolvimento interior, desenvolvimento pessoal, sinto-me bem.
Lembrei os monges na quietude de seus templos e do próprio Buda que encontrou a iluminação (espiritual), solitário sob uma figueira. Moises e seus 40 dias no monte Sinai, de Amyr Klink e sua travessia solitária num barco a remo em 1984.
Entretanto, há uma solidão que não tem relação com o encontro com o outro, porque se assim fosse, as pessoas que têm vários amigos ou aquelas que estão casadas e que constituíram família, não teriam um sentimento de ausência. Essa é talvez a diferença entre a procura pela solidão – no sentido de crescimento interior – e a sensação da solidão, como uma ausência.
Mas poderíamos supor que nos dias de hoje seria impossível sentir-se sozinho, porque através dos meios de comunicação existentes, tais como, as salas de bate-papo, e-mail, sites de relacionamentos, etc., não existiria espaço para a solidão. Ledo engano.
A solidão que isola, que desconforta, é justamente o encontro com o vazio.
Vazio, esse, que é a ausência dos contatos essenciais. Daquilo que é fundamental, essencial para as pessoas. E nessa subjetividade – do sentimento de solidão – cada pessoa que se sente dessa forma, vive isso de maneira particular, e se desarticula de forma única, podendo comprometer as relações em que vive.
A solidão da qual estou agora – escrevendo para a coluna do jornal – é a solidão necessária para me encontrar e achar a melhor forma de relatar aquilo que eu penso, é uma solidão de um ajustamento criativo, para descortinar novas descobertas. A outra solidão, aquela do encontro com vazio, é a solidão dos que estão desamparados e ameaçados em suas qualidades de vida, que estão interrompidas, que se sentem como no soneto de Camões: “É um andar solitário entre a gente”.
Penso nessa solidão que é aflitiva, e nas pessoas que se sentem assim, para não se distanciarem mais ao ponto de não querem ajuda, pois, nessas horas, caminhar sozinho é mais fácil para se perder do caminho.
((Texto de Michell Foitte publicado no Jornal Evolução em Dezembro de 2011. O autor está de férias e retornará em Janeiro de 2014)).