Pouco antes do almoço no dia do centenário da Banda Treml, o presidente da mesma, Marcio Brosowksy, concedeu a presente entrevista ao Evolução.
Não gosto de dizer Uma banda alemã. Se fosse uma banda alemã, seria uma banda de alemães. Aqui temos diversas etnias que compõem a banda, vários sobrenomes, pessoas de diferentes idades. Ninguém faz uma apologia à germaneidade não existe isso. Temos que manter a música e a música que identifica São Bento do Sul são aquelas valsas, aquelas marchas características (Foto Elvis Lozeiko/Evolução)
EVOLUÇÃO – Nesta ocasião especial, dia 1º de maio, quando a Banda Treml completa 100 anos, conversamos com o presidente da banda. Marcio Brosowsky, o que falar desta data?
MARCIO BROSOWSKY – Já há três anos começamos a pensar no centenário. Parecia uma data tão distante, mas ela chegou!!! Então, hoje (quarta-feira), os olhos se abriram às seis horas da manhã, já sem vontade de dormir mais e pensando: “Como será o nosso dia? Como o nosso dia transcorrerá?”. O fato é que está transcorrendo muito bem. O tempo está ajudando, o povo compareceu, recebemos várias manifestações nos últimos dias, foram várias entrevistas a rádios, jornais e televisão. Então, a Banda Treml, nesta semana, está na mídia. É um dia muito especial para nós. A Banda Treml representa algo bem característico de São Bento do Sul. Não há um único são-bentense que algum dia não esteve com a Banda Treml, seja numa retreta, na rádio, numa festa, num aniversário ou com os próprios músicos. Então, é algo tradicionalmente nosso. Quando se fala em São Bento do Sul, o que vem à cabeça inicialmente? A Banda Treml, que hoje cem anos.
EVOLUÇÃO – Ao acordar, hoje, você pensou algo assim: “Meu Deus, hoje é o centenário da banda que eu presido”?
MÁRCIO BROSOWSKY – Acordei calmo. A gente se programou bem. A banda tem uma diretoria, tem um maestro – mas todo mundo trabalha unido e tudo foi muito bem organizado. Todos os detalhes foram amplamente discutidos antes, inclusive os brindes, os presentes, etc. Quando acordei, apenas pensei: “Hoje chegou o dia”. Eu estou tranquilo, porque estava tudo preparado, ainda que algumas coisas tenham chegado na última hora, como foi o caso dos CDs. São coisas que acontecem. As pessoas estão ganhando uma flâmula de presente também. O bolo e o almoço para convidados também são oferecidos pela banda. Então, realmente nos preparamos para isso.
EVOLUÇÃO – Você dizia com o nosso gravador desligado que em alguns outros locais do Brasil, como Pernambuco e Minas Gerais, também existem algumas bandas centenárias. Mas, no nosso caso, essa data é um orgulho não só para a própria banda, para o presidente ou para os integrantes, mas para a própria cidade de São Bento do Sul!!!
MÁRCIO BROSOWSKY – Ah, com certeza. Pesquisando na internet, percebemos que uma ou outra corporação musical já passou de cem anos, mas isso é muito raro. Alguns Estados do Brasil têm tradição de bandas de coreto muito grande, como Pernambuco e Minas Gerais. Em Minas, muitas cidades têm coreto e suas bandas municipais. Algumas destas bandas já ultrapassaram os cem anos. Aqui no sul do Brasil, em relação ao nosso estilo de apresentação, a Banda Treml é a única banda centenária atualmente.
EVOLUÇÃO – Como se pode definir o estilo da banda?
MÁRCIO BROSOWSKY – A banda surgiu da ideia de músicos que vieram além-mar, ou seja, da Alemanha. Eles trouxeram de lá uma maneira de tocar a música que tocamos hoje em dia, que é a formação típica de uma banda da Alemanha. Esse estilo sempre caracterizou a Banda Treml. A Banda Treml não é uma banda marcial e não é uma banda de fanfarra, mas é uma banda de apresentação de música de sopro. Na língua alemã, existe a palavra “blasmusik”, que, traduzida, significa “música de soprar”. Essa é a característica da banda, embora toquemos música brasileira, música americana e outros estilos também. Porém, o miolo da banda, o que norteia a banda, é esse estilo germânico.
EVOLUÇÃO – Tem gente que considera a Banda Treml uma “banda alemã”. Porém, apesar de todas as raízes germânicas, não é isso, correto? Vemos até mesmo a cidade de São Bento do Sul e a miscigenação que está ocorrendo – basta olhar, por exemplo, o sobrenome do presidente da banda...
MÁRCIO BROSOWSKY – Exatamente. Meu sobrenome é polonês. O do maestro (Luis Francisco Kamienski) também é polonês. Sempre digo que quem está na Banda Treml é porque gosta do que faz. Não nos consideramos uma banda alemã. Nós mantemos as raízes desde a fundação, apresentando a música que os imigrantes trouxeram. Então, somos uma banda que cultiva a nossa tradição. “Banda alemã” é uma coisa meio deslocada – não concordo com isso. Tanto é que, após a Segunda Guerra Mundial, quando terminou o conflito armado, a Banda Treml foi convocada para uma retreta na praça Getúlio Vargas, em agosto de 1945, após a derrota da Alemanha. Fomos convidados para comemorar a vitória dos Aliados. Claro, a inspiração vem do estilo musical dos nossos antepassados, mas a banda é brasileira! É uma banda daqui, são-bentense. Não gosto de dizer “Uma banda alemã”. Se fosse uma banda alemã, seria uma banda de alemães. Aqui temos diversas etnias que compõem a banda, vários sobrenomes, pessoas de diferentes idades. Ninguém faz uma apologia à germaneidade – não existe isso. Temos que manter a música – e a música que identifica São Bento do Sul são aquelas valsas, aquelas marchas características.
EVOLUÇÃO – A Banda Treml passou por várias transformações durante cem anos, evidentemente. A presença de mulheres, por exemplo, até certo tempo não era permitida? Outra coisa que vemos hoje são pessoas mais jovens integrando o grupo...
MÁRCIO BROSOWSKY – No começo da banda, quem eram os músicos? Pessoas imigradas. Aqui era uma região muito inóspita. Não havia comunicação com nenhum lugar do Brasil. Então, a banda manteve uma característica única na época. Houve vários problemas – basta citar que foram duas Guerras Mundiais. O Brasil foi proibido de fazer qualquer manifestação artístico-cultural de países que eram do Eixo. O Brasil declarou guerra à Alemanha. Tudo isso refletiu em São Bento do Sul também. A partir daquela época, quando foi proibida a manifestação dessas culturas, os nossos autores de São Bento do Sul foram obrigados a escrever músicas nossas. Isso acabou trazendo benefícios à Banda Treml também. Tem gente que diz que a cultura foi podada por causa das guerras – claro, o mundo inteiro sofreu com isso. A banda também sofreu, mas isso teve algumas coisas positivas também. A Banda Treml, alguns dizem, durante oitenta anos foi uma banda do “clube do bolinha”. Não foi! Na verdade, não existiam musicistas mulheres na época. Depois de algum tempo, até por influência da Escola de Música (Donaldo Ritzmann), começaram a surgir moças tocando clarinete e saxofone – e isso passou a ser interessante para a banda também. Hoje temos cinco mulheres que integram a Banda Treml. Dia destes eu estava conversando com a Dilma (Neumann), a primeira mulher que entrou na banda sobre isso, ou seja, não havia musicistas mulheres na época. Hoje a banda está renovada, com uma cara bem diferente do que há trinta anos.
EVOLUÇÃO – Márcio, a conversa poderia durar horas e horas, mas temos um almoço nos esperando, né...? Por favor, algo mais a nos relatar?
MÁRCIO BROSOWSKY – Quero dizer meu muito obrigado. O músico vive do aplauso que vem do público, da admiração do público. Isso é muito importante. Isso é dividido entre os corações dos músicos. É isso o que nos move e o que nos dá força para continuar com essa bonita tradição.