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"Especulações são naturais", diz dom João Braz de Aviz sobre sucessão do papa

Quinta, 14 de fevereiro de 2013

 

Cardeal catarinense fala sobre a renúncia e o legado de Bento 16

 
 
 
 
"Especulações são naturais", diz dom João Braz de Aviz sobre sucessão do papa Arquivo pessoal/Arquivo Pessoal
Cardeal dom João Braz de Aviz Foto: Arquivo pessoal / Arquivo Pessoal
Camila Guerra

 

Eram 18 horas pelo horário de Brasília quando a reportagem de "A Notícia" conseguiu contato via celular com o cardeal do Norte catarinense dom João Braz de Aviz. Naquele momento, eram 21 horas em Roma, e ele ainda estava no Vaticano. Segundo a sua secretária, o anúncio da renúncia de Bento 16 deixou os arredores da basílica de São Pedro em polvorosa, e dom João foi obrigado a desconsiderar os compromissos previstos na sua agenda para atender a outros de última hora.

Demonstrando simplicidade, ele atendeu ao telefone ao som de "pronto" e, após questionar se a entrevista seria demorada, concordou em responder a algumas perguntas do "AN".

A conversa foi breve, durou 18 minutos, mas foi tempo suficiente para confirmar alguns adjetivos atribuídos a dom João por familiares e amigos, que o julgam carismático, humilde e abençoado por ter chegado tão longe dentro da Igreja.

Hoje, além de cardeal, ele é o prefeito da Congregação para os Institutos de Vida Apostólica, cargo mais elevado entre os cinco cardeais brasileiros. A voz em tom baixo transmite serenidade; as pausas antes de responder às perguntas sugerem sua ponderação; e a atenção ao longo da entrevista demonstra simpatia e carisma.

Em 1º de março, ele estará entre os 125 cardeais da Igreja que terão a oportunidade de participar de um momento histórico: a escolha do próximo papa. Dom João reagiu com bom humor à possibilidade de ser escolhido como o próximo papa.

— Eu respondo com um sorriso para você. Não posso dizer mais do que isso — disse.

Confira os principais trechos da entrevista e as opiniões de dom João sobre temas como a herança deixada por Bento 16, a chance de haver um papa brasileiro e que característica deve ter o próximo papa para suprir as necessidades atuais da Igreja.






A renúncia do papa

O fato foi considerado insólito por todos nós, uma coisa que não se esperava, foi uma surpresa enorme porque fomos convocados pelo papa para o consistório e normalmente essa reunião é para definir novos santos para a Igreja. A Congregação para os santos propõe, o papa considera, pergunta se nós temos alguma coisa contra e então aprova. E essa parte foi realmente feita e, em seguida, depois de uns 45 minutos, veio essa colocação do papa. Em três minutos, foi uma coisa bem rápida, ele fez a sua renúncia. E para nós foi uma surpresa enorme, tanto que eu perguntei para o cardeal ao meu lado se eu tinha entendido direito do que se tratava e, de fato, foi confirmado que era isso mesmo, que era a renúncia.

Atitude de humildade

É um fato insólito porque faz muitos séculos que isso não acontece. Demonstra da parte do papa uma atitude de muita humildade, no sentido de deixar de lado essa missão tão grande para o mundo inteiro, não só para a Igreja. E também o fato de uma pessoa que está muito consciente da sua fragilidade pela idade. Ele não tem uma doença particular agora, mas tem um enfraquecimento geral, pelos seus 85 anos. E sabe que talvez a próxima fase seja mais difícil. Isso ele não falou, mas talvez ele tenha na cabeça e no coração toda a experiência que foi com o João Paulo 2º, muito humana, e que nos fez valorizar muito a parte das pessoas idosas. O papa tomou uma atitude de liberdade em renunciar.

Chances de se tornar papa

O pessoal faz tudo quanto é tipo de conjectura. Se fosse um outro país que tivesse outro cardeal naturalmente o pessoal falaria também. São cinco cardeais brasileiros, estão em um número de 125 que vão estar presentes no conclave, que vai começar dia 1º de março e ali, naturalmente, haverá oração, comentários sobre o momento atual da Igreja e haverá depois uma escolha segundo as necessidades do que a Igreja pensa.

Um papa brasileiro

Nesse momento, o número majoritário de fiéis católicos está na América Latina. Isso nós sabemos e se conservou um espírito religioso também muito interessante. Isso já na Europa não existe mais, nos Estados Unidos existe em parte, no Canadá existe em parte, na Austrália existe em parte. Na África há ainda um senso religioso muito profundo. Na Ásia já há normalmente esse senso profundo nas grandes religiões, e agora também um despertar muito grande para o catolicismo. Nós podemos dizer que muitas dessas situações não são mais tão comuns.

Não há favoritos

Neste sentido, qualquer previsão é sempre especulativa, não dá para a gente saber em que direção a coisa vai. No conclave passado, era muito evidente que o cardeal Ratzinger estava numa posição muito forte com relação à pessoa de João Paulo 2º, a todo tempo dele de papa. Mas agora não temos essa situação. O que temos é um colégio cardinalístico bastante internacional, e isso é muito bonito e muito bom, e significa que toda a Igreja está também partilhando neste momento, não é uma coisa que prevalece só um lado. Eu não tenho um nome para apontar como favorito. Não tenho porque eu nem conheço direito os cardeais. Hoje mesmo tive que perguntar o nome de dois cardeais porque eu não sabia. As relações nossas aqui são muito oficiais e, muitas vezes, o contato pessoal é mais difícil. Mas eu não tenho um nome, digamos assim, de preferência.

Herança de Bento 16

Ele deixa uma herança extraordinária. Um papa muito preparado pela fidelidade à Igreja. João Paulo 2º, o grande papa de iniciativas enormes, teve em Ratzinger um sustento enorme pela sua competência, pelo seu amor fiel à Igreja e pela comunhão profunda com o papa anterior. A gente nota em Bento 16 um jeito diferente. Ele é uma pessoa que sempre foi mais tímida, de um relacionamento pessoal muito intenso. A gente se sente muito presente quando está com ele. Um papa que soube dialogar com todos os humanos, seja de quem tem fé, seja de quem não tem fé, seja com religiões diferentes da católica, como é o caso do budismo, do hinduísmo, do judaísmo e também dos muçulmanos. E soube fazer isso com uma atitude de respeito e ao mesmo tempo com atitude de busca da verdade, nunca se omitiu ao apresentar Jesus Cristo como a verdade.

Entre razão e fé

Bento 16 também foi o papa que soube dizer a nós que o diálogo entre razão e fé é possível, consciência e fé é possível, não há contradição. Uma coisa muito bonita é o respeito dos intelectuais, dos chefes religiosos, dos grandes líderes mundiais por essa figura competente e simples. Uma das coisas que a gente admira muito nele são as suas homilias, feitas com tanta simplicidade e com tanto ensinamento fácil de podermos colocar em prática. Eu tenho a impressão de que ele vai ser guardado como um desses papas que não teve medo de ajudar a Igreja a corrigir os seus erros. A gente pode lembrar tudo o que houve a respeito da correção do problema da pedofilia na Irlanda e em outros países. Tudo que foi feito no ato de purificar aqui no Vaticano as atitudes erradas, que são de quem se quer realmente transparência e verdade. E agora esse ato corajoso de quem diz "Não quero fazer a Igreja sofrer".

O perfil ideal

Nós estamos em um momento em que a mudança na cultura é muito grande. A gente observa, por exemplo, toda a questão do desenvolvimento tecnológico, toda a questão de mudança de muitos dos nossos valores, que nós tínhamos e que a sociedade atual mina todos esses valores com outras necessidades e outros critérios. Nós temos essa pergunta se há a necessidade de valores eternos, valores grandes e universais para conduzir a vida humana, ou se não seria o caso de cada um se virar como pode, com o seu individualismo, como hoje é comum. A necessidade hoje de você ter que conviver com outras culturas, num diálogo constante, porque nenhuma cultura pode se impor às outras. A capacidade de buscar a verdade, testemunhá-la antes de impô-la, isso também passa pela Igreja, porque todas essas coisas nós estamos aprendendo. Com o Evangelho, nós estamos aprendendo a passar de uma cultura mais individualista, para alguns mais secularizada, como é o caso da Europa, para uma cultura mais de diálogo. E isso está muito de acordo com a nossa fé. Então, tudo isso hoje está sendo provado que o papa terá que ter muita capacidade de aprofundar isto.

Os dois lados da Igreja

Eu penso que a Igreja tem dois lados. Tem um lado que é profundamente tradicional, mas não no sentido tradicionalista. A Igreja vive da tradição, isto é, daquilo que é passado de pai para filho desde o momento em que Jesus chegou, até antes, porque nós valorizamos o Antigo Testamento. Então, este testemunho vem sendo transmitido e é algo que perpassa os séculos, senão nós não teríamos conhecido o Evangelho hoje. Agora, a Igreja se confronta sempre com a cultura do momento e ela tem perguntas novas que não tinha antes. A gente, no papa como o zelo pela doutrina, não tirou dele a capacidade de dialogar com a cultura atual. Esse equilíbrio leva, de um lado, a conservar bastante a tradição, e do outro lado, a também abrir-se para o novo. Isso tem que ser feito não segundo as modas, não segundo ideologias, não um tipo de moral, não na ciência, mas nas posições pessoais ou ideológicas. E isso o papa soube enfrentar também. Nós vemos nele um papa de muita profundidade.

Cada papa no seu tempo

Penso que cada papa terá uma postura. Há seis séculos pela história da Igreja que não tínhamos um papa que renunciasse. No passado, porém, tivemos vários. Então, há duas atitudes, é menos a atitude da renúncia. Pode ser que algum outro papa na idade contemporânea veja também desse modo. Naturalmente, tudo tem que ser muito bem pesado porque a Igreja não pode ter dois papas.



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