Acrobata é uma das estrelas do espetáculo Love, inspirado nos Beatles
O caso a seguir poderá soar tão improvável em Schroeder, Norte do Estado, quanto foi para este repórter, há uma semana, durante uma visita aos bastidores do espetáculo Love, um dos mais bem-sucedidos shows do Cirque du Soleil em exibição na escaldante Las Vegas, nos Estados Unidos.
Entre os dois brasileiros do elenco escalados para conversar com um grupo de jornalistas da América Latina, Ekenah Claudin, 33 anos, um ex-ginasta olímpico formado na França, surpreende:
- Nasci em Santa Catarina, numa colônia chamada Schroeder.
Mundo pequeno esse, dirão os leitores da pequena cidade ao Norte de Santa Catarina, onde o acrobata - e hoje uma das estrelas do espetáculo inspirado nos Beatles - nasceu e viveu até os 11 anos. Levou pelo menos uma década para Ekenah ingressar no mundo artístico, mas era questão de tempo para o filho de uma bailarina brasileira e de um roteirista teatral francês.
A primeira experiência -e única na sua cidade natal - foi amadora, ainda criança, quando participou da encenação da Paixão de Cristo, produzida pelo pai, que depois o levou para Le Bains, na França, a fim de garantir-lhe "melhor educação". Lá, aos 14 anos, ingressou na ginástica olímpica. As referências da infância e o contato com a "colônia" de origem ficaram para trás. O performer jamais voltou a Schroeder, a mãe vive em Goiás e o pai mora na África.
Agora ele é um dos espectros - os "nowhere men" - que representam a origem proletária e libertária dos quatro rapazes de Liverpool, encarregados de anunciar a transição entre os atos e temas musicais. Sua chegada até o espetáculo, em cartaz há sete anos no suntuoso cassino e hotel Mirage, foi uma sequência de acasos dentro da própria companhia canadense:
- Surgiu uma oportunidade no ano 2000, mas não permaneci. Voltei em 2004, depois de passar em uma audição para o La Nouba (espetáculo sediado em Orlando). Fui para Montreal (Canadá, sede da companhia) iniciar os ensaios e foi quando me ofereceram um papel para um novo show que seria criado: o Love.
O que se seguiu foi uma sequência tão fantástica quanto o universo que mistura drama, música e fantasia em escala vertiginosa deste show, que leva centenas de milhares de pessoas a cruzarem os Estados Unidos e o Atlântico todos os anos. Ekenah participou diretamente da concepção do espetáculo, que envolveu tanto os beatles vivos Paul McCartney e Ringo Starr como Yoko Ono e Olívia Harrison, respectivamente viúvas de John Lennon e George Harrison.
Tudo teve que ser submetido ao crivo rigoroso do grupo: da caracterização ao repertório. O que ele testemunhou foi um processo de negociação difícil, que exigiu um trato político da produção e paciência extrema, que teve momentos de impasse, a ponto de a produção ser suspensa e o diretor Domique Champagne abandonar, para voltar meses depois.
- Ao mesmo tempo que buscamos personificá-los na sua essência, havia toda uma preocupação e cobrança para que houvesse um equilíbrio na representação entre os quatros. Foram oito meses de preparo e a parte política foi a mais difícil deste show. Da negociação entre o Cirque du Soleil e as famílias dos Beatles. A palavra final era sempre deles - relata Ekinah, declaradamente fã do beatle George Harrison.
Preparação inclui treinos diários e três horas de atividades físicas
Love é um deslumbre pop, um concerto performático a partir de um repertório clássico de 20 canções, trabalhadas pelo veterano produtor dos Beatles, George Martin, sobre 130 trechos originais. Mesmo em se tratando de sir Martin, a tarefa não foi nada fácil. No palco, 70 performers se empenham na apoteose visual e musical de uma hora e meia de duração.
São duas sessões diárias, três horas de atividades físicas, para qualquer atleta de alta performance, como foi Ekenah até a década de 1990, quando atuou como ginasta, competindo oficialmente pelo mundo, até enveredar para o ambiente circense e para o ensino da capoeira.
Em Love, Ekenah conta com a companhia da conterrânea Silvia Aderne, veterana atriz de teatro brasileira, que ingressou no Cirque du Soleil aos 69 anos, também para atuar na montagem. Nos outros seis espetáculos residentes do grupo em Las Vegas, são 15 brasileiros atuando, segundo os cálculos da dupla.
A encantadora e extrovertida Silvia contrasta com a resignada e solitária personagem Eleonor Rigby (da canção do álbum Revolver), que assiste a solidão do mundo e da morte. Nascida na Paraíba, fez carreira como professora do ensino fundamental até formar-se atriz, onde fundou e atuou por quase três décadas na companhia Hombu, do Rio de Janeiro.
Aos 77 anos, está devidamente integrada à rotina do Cirque e de Las Vegas, mas confessa que não conseguia imaginar como uma veterana atriz se encaixaria em um espetáculo puramente performático e acrobático.
- Disseram que era um papel perfeito para mim. E é. Foi aqui que eu virei uma beatlemaníaca - brinca Aderne, que se declara também uma embaixadora da capital catarinense.
Ela atua como tradutora para uma apaixonada acrobata do espetáculo e seu namorado, um rapaz de Florianópolis. Vejam só, que mundo pequeno esse.
*O repórter viajou a convite da Copa Airlines
Os mais poderosos
A brincadeira corrente em Las Vegas é que o Cirque du Soleil manda mais na cidade do que a máfia, que ajudou a construir o império do entretenimento adulto naquele meio de deserto. Uma alusão à presença maciça da trupe canadense, que conta hoje com sete espetáculos residentes em cartaz nos principais hotéis cassinos da cidade e assumem a ponta de lança em uma programação que conta com mais 400 opções atrações em exibição diariamente na cidade.
Sorte e azar em Vegas
Não fui feliz nas minhas tentativas de fazer fortuna nas máquinas caça-níqueis da Strip Las Vegas. Pelo menos no campo jornalístico a sorte me afortunou. Estava naquele paraíso da perdição a convite de uma empresa aérea, na companhia de outros 21 jornalistas da América Latina. Era a segunda entrevista com integrantes do Cirque du Soleil no suntuoso cassino e hotel Mirage. O fato de terem escalado dois brasileiros pouco me entusiasmou, porque a propabilidade de se encontrar um catarinense é tão rara quanto faturar o US$ 1 milhão no Jack Pot. A barbada apontava, pela ordem, algum gaúcho, paulista, carioca ou mineiro de Governador Valadares. Vá lá um criciumense, mas só se o show fosse inspirado no Rush. Eis que se confirmou: um catarinense! Empolgado com a possibilidade de ser um sinal, corri para o salão de jogos: perdi US$ 5.
Love
Em cartaz desde 2005, é um dos mais prestigiados e concorridos espetáculos da companhia canadense atualmente em Vegas. A celebração do legado dos Beatles tornou o Cassino e Resort Mirage um dos pontos de peregrinação para os beatlemaníacos do mundo inteiro.
São 70 artistas envolvidos no espetáculo
Produção musical de Sir George Martin, que foi produtor musical da banda
A trilha sonora foi concebida a partir de 130 trechos de gravações originais que formaram o repertório de 26 canções
Love, o álbum, recebeu dois Grammy – a maior premiação da música mundial – em 2010
Seis mundos
- Viva Elvis: Em cartaz até agosto no Aria
- Mystére: Longevo espetáculo acrobático, em cartaz há 18 anos no hotel cassino Treasure Island
- O: Show que mistura performances acrobáticas e aéreas com efeitos aquáticos, em exibição no Mirage. Detalhe é que O inspirou a construção de uma fonte de água dançante em frente ao hotel
- Zumanity: A “Cidade do Pecado”, dada a sua tradição em shows de strip, ganhou uma versão picante no New York-New York Resort
- KÃ: Espetáculo em exibição no MGM Grand
- Criss Angel Believe: Produzido em parceria com o ilusionista Criss Angel