Em 16 páginas do inquérito, Enio é citado 22 vezes. Em 11 vezes, as citações são feitas pelos personagens grampeados pela PF. Nas outras 11 vezes, são citações feitas pelos investigadores em resumos das conversas ou em interpretações dos agentes.
Parte da investigação vazou neste final de semana, depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter compartilhado a documentação – que estava em segredo de Justiça – com a CPI do Congresso que investiga a ligação entre Cachoeira e políticos.
Nenhuma das gravações mostra diálogos de Enio Branco com o senador goiano Demóstenes Torres e nem com Cachoeira. O atual secretário estadual de Comunicação, à época das escutas (março a agosto de 2011) estava à frente da SC Participações (SCPar), estatal responsável por captar investimentos privados para o Estado. Enio não foi gravado pela PF, mas seu nome aparece nos diálogos.
Às 9h38min de 8 de agosto do ano passado, Demóstenes diz a Cachoeira que precisa falar com urgência sobre Enio Branco:
— Demóstenes — Eu preciso falar com você urgente. Assim que sair daqui. O Enio Branco me procurou, foi embora, mas deixou aqui algumas coisas pra você resolver.
— Cachoeira — Quem?
— Demóstenes — Enio.
— Cachoeira — Ah, tá bom.
Às 15h04min, Cachoeira liga para Wladmir Garcez, vereador do PSDB em Goiânia e apontado pela PF como braço direito do contraventor. Na conversa, Cachoeira avisa que Branco "quer fazer um negócio":
— Cachoeira — Pra procurar urgentemente o Enio, tá. O Enio quer fazer um negócio lá. A rodoviária. Já falou com o governador. O governador já liberou e o trem tá com ele.
— Wladmir — Nossa senhora, beleza. Vou ligar pra ele aqui já.
Mais de hora depois, Cachoeira, que havia se reunido com Wladmir na sede da empresa Delta Construção (citada em inúmeras suspeitas no inquérito), pergunta a Demóstenes sobre como articular com Enio uma conversa sobre a rodoviária.
— Cachoeira — Aquele negócio da rodoviária lá, como é que fala com o Enio, hein?
— Demóstenes — Vou te dar o telefone.
— Cachoeira — Não, cê podia falar com ele já pra marcar pro pessoal ir lá. É só procurar lá? Fala com o Wladmir.
— Demóstenes — Vou ligar pra ele depois te retomo aí.
Um mês antes, em 6 de julho de 2011, um homem não identificado pela PF pede para Cachoeira falar com Demóstenes, para que o senador consiga uma reunião com o governador Raimundo Colombo. O contraventor responde que "quem resolve esse problema é o Enio" .
No dia seguinte, Cachoeira diz a Demóstenes que o argentino Roberto Coppola está em Florianópolis e quer se encontrar com Enio. Segundo a PF, Coppola é considerado "um megaempresário do ramo de caça-níqueis" e atua como consultor de Cachoeira na abertura de empresas e na construção de sites de jogos online. Na sequência do telefonema, Cachoeira pergunta se Demóstenes pode marcar o encontro com Enio, recebendo resposta positiva.
Uma hora e 40 minutos mais tarde, Demóstenes retorna a ligação para Cachoeira, passando o endereço no qual o argentino poderá se encontrar com Enio. Trata-se do prédio da Secretaria e Administração, onde também funciona a SC Par. Nesta altura do inquérito, a PF faz o seguinte resumo:
"Demóstenes passa endereço para Roberto Copolla encontrar Enio Branco SC 401 centro administrativo, caminho das praias norte da ilha. SCPAR, órgão que ele preside, onde fica Secretaria da Fazenda".
Em seguida, ainda segundo o inquérito da PF, Cachoeira telefona para Coppola, repassando o local do encontro com Enio.
No dia 10 de julho, Demóstenes diz por telefone ao bicheiro que Enio está na “praça”, e pergunta se Cachoeira quer encontrá-lo. Pelos relatórios da PF, nessa época o grupo discutia uma forma de participar da construção da uma nova rodoviária. Diz o resumo da PF:
"Carlinhos diz que precisam falar com Enio. Negócio de Santa Catarina. Fernando. Artec fez a rodoviária em Brasília e é a mesma obra que Santa Catarina precisa ..."
O inquérito da PF, então, reproduz diálogo de Cachoeira e Demóstenes:
— Cachoeira — Você só fala com ele que você já está sabendo disso daí, que é importante, que a Artec já fez o negócio em Brasília. A rodoviária, nova, viu? E é o mesmo que a gente está precisando lá em Santa Catarina, e é com ele. Você avisa a ele antes dele ir embora.
— Demóstenes — Vou falar com ele. Vou ligar pra ele agora.
Um outro relatório, produzido pelo Ministério Público Federal, mostra que Enio também foi citado por este órgão. O relatório afirma que Enio foi presidente das Centrais Elétricas de Goiás (Celg), "tendo sido afastado do cargo em razão de suspeita de, no exercício do cargo, ter beneficiado a empresa Ecoluti Tecnologia e Serviços Ltda".
Contraponto:
Procurado pelo Diário Catarinense, neste domingo, Enio Branco disse queria ler primeiro o inquérito da PF para se inteirar das citações envolvendo seu nome. O secretário afirmou que abordaria somente os pontos que mereciam explicação. Em alguns deles, preferiu não se manifestar, por entender que seu nome estava sendo usado de "forma indevida" e que não falaria sobre o "que não lhe diz respeito".
Segue a íntegra da nota enviada pelo secretário:
"1. Muito embora não haja registro sobre telefonemas trocados com Carlos Ramos ( Cachoeira ), meu nome aparece em diálogos entre o mesmo, o Senador Demóstenes Torres e pessoas do relacionamento de ambos; registre-se que não fui, em momento algum, alvo de investigação, nem tive meus telefones monitorados;
2. Reitero que conheci o Senador em 2007 e mantive amizade com o mesmo e seus familiares; entretanto com Carlos Ramos, tive raros contatos, especialmente em encontros de natureza social, face minha responsabilidade como presidente da Companhia Energética de Goiás não guardar relação com interesses empresariais do mesmo, haja vista que, publicamente, aparecia como empresário das áreas de remédios e agronegócio. A questão do jogo, dizia-se em Goiás, era coisa do passado.
3. Retornando à Santa Catarina e como presidente da SCPar - Participações e parcerias, recebi do Senador Demóstenes e de tantas outras pessoas físicas e jurídicas a nível nacional, telefonemas solicitando recepcionar grupos empresariais interessados em investir em nosso Estado; registre-se que a missão maior da SCPar é justamente atrair investimentos para Santa Catarina;
4. Pontualmente: o primeiro tratava-se de receber um Grupo, acompanhado de advogado interessado em protocolar na Codesc, parecer do renomado jurista nacional Geraldo Brindeiro, o qual, conforme tratativas iniciadas no ano anterior com a diretoria da Empresa, sustentaria a Constitucionalidade da LOTESC e a criação de uma Loteria Estadual, como forma de viabilizá-la e gerar receita para a Empresa.
5. Como era início de 2011 e o assunto vinha do ano anterior, após ouvir os interessados, não dei sequência, jamais tendo contatado o presidente da Codesc, primeiro pelo fato da matéria não ser de responsabilidade da SCPar, bem como por ter conhecimento que o Governador, por concepção pessoal, sempre foi contra o jogo;
6. A questão referente a extinção da Codesc foi ventilada publicamente, tendo recebido na SCPar empregados da casa e consultas externas sobre a veracidade de estudos com aquele objetivo; na visita do governador de Goiás ao governador Raimundo Colombo, no carnaval do ano passado, este assunto não foi em momento algum abordado;
7. O segundo pedido foi no sentido de receber diretores de uma empresa interessada em apresentar projeto de construção de uma nova Rodoviária no lugar do Terminal Rita Maria, em Florianópolis, aproveitando modelos bem concebidos em Goiânia e Brasília; os recebi juntamente com diretores e técnicos da SCPar, oportunidade em que foi feita a referida apresentação.
8. O assunto não avançou tecnicamente e a idéia de PPP - Parceria Público Privada não chegou a ser encaminhada à Seinfra e ao Deter. Ao governador jamais foi apresentado.
Finalmente, declaro nunca ter tido relação comercial ou pessoal com Carlos Ramos ( Cachoeira ) e sim, atendido pleitos do Senador Demóstenes, Promotor e Procurador de Justiça, à época homem de reconhecida e ilibada reputação, autor do prefácio do livro Ficha Limpa, iniciativa da OAB e um dos maiores expoentes do Congresso Nacional, a ponto de ter sido eleito, diversas vezes, por jornalistas especializados um dos 100 brasileiros mais influentes.
A nação está perplexa; comigo não é diferente.
Exerci minhas atividades na CELG, como Controller, chegando a Diretor e Presidente, credenciado como técnico do setor elétrico, após experiência exitosa na CELESC, onde a modelagem da operação BNDES serviu como exemplo de sucesso e de boa governança econômico-financeiro.
Deixei a Empresa por iniciativa própria, após ter concluído o desenho de operação de saneamento similar ao modelo Catarinense e não ter obtido apoio governamental para sua conclusão. Minha passagem por Goiás ficou marcada para sempre na minha memória, pelo fato de ter sido agraciado com os Títulos Honorários de cidadania Goianiense e Goiano, o que muito me honrou!
CONCLUINDO, AFIRMO QUE A MENÇÃO AO MEU NOME, INDEVIDAMENTE, AFORA OS CASOS APONTADOS ACIMA, SÃO DE INTEIRA RESPONSABILIDADE DE QUEM OS PRONUNCIOU, NÃO PODENDO POR ELES RESPONDER EM FUNÇÃO DE NÃO TER COMPREENDIDO OS CONTEXTOS CONSTANTES NO INQUÉRITO.
Florianópolis, 29 de Abril de 2012.
Enio Andrade Branco"